segunda-feira, 28 de dezembro de 2009

Muito movimento, mas nem tanto conteúdo

Nas cênicas, 2009 foi marcado pelas comédias “stand ups”, pela forte expressão circense, boas surpresas na produção local e festivais marcantes

Se pararmos para fazer um balanço sobre como foi o ano de 2009 para os palcos recifenses, veremos que este foi um ano bastante movimentado. As pautas dos teatros estavam fechadas desde o início do ano, e pode-se dizer que um público ainda tímido, mas fiel, deu conta do recado e prestigiou o que foi apresentado. Este foi o ano de bons Festivais - a exemplo do Janeiro, Mostra Antunes Filho, Festival de Circo, Festival de Dança, Palco Giratório, entre outros - de algumas boas novidades, e de muitas, muitas visitas de globais. Algumas satisfatórias, outras nem tanto. Além de, é claro, ter sido o ano do “Stand Up Comedy”. Recife, e o resto do País, viram o gênero se proliferar e fomos soterrados com uma infinidade de apresentações que parecem fazer sempre as mesmas piadas.

Ainda no comecinho do ano, completando a idade de uma doce debutante, o Janeiro de Grande Espetáculos mostrou que passa longe da ingenuidade de uma menina de 15 anos. Na sua 15ª edição, a mostra competitiva corou “Ato”, da companhia Magiluth como o melhor espetáculo e presenteou o público com montagens convidadas de peso, a exemplo da tocante “Alguns Leões Falam”, da Cia. Clara, de Minas Gerais. O alto nível da curadoria - que pecou apenas em deixar a abertura a cargo da mediana “Cantigas do Sol” - comprovou a inquietude por trás da Apacepe em realizar um festival democrático e pertinente.

Em março, o público recifense foi presenteado com um evento que celebrava o aniversário de um dos principais nomes do teatro nacional. A mostra teatral “O Universo Antunes Filho”, marcou os 80 anos de dramaturgo, seus 60 anos de carreira, e os 25 anos de criação do Centro de Pesquisas Teatrais (CPT), trazendo para Cidade clássicos da carreira do diretor, como “Foi Carmen”, “ A Falecida - Vapt Vupt” , e “Prêt-à-porter”.

No mesmo mês, três espetáculos pernambucanos representaram o Estado no Festival de Curitiba, um dos principais festivais de teatro do País. “Fio invisível da minha cabeça”, da Companhia do Ator Nú; “... No Humor Como na Guerra”, da trupe Galpão das Artes; e “Uma viagem através das estrelas” do grupo Ciência Cênica.

Abril marcou o início da corrida pelos ingressos com preços estratosféricos do Cirque Du Soleil, que se apresentaria na Cidade, pela primeira vez, em julho com o espetáculo “Quidam”. Na mesma época, fomos docemente surpreendidos pela montagem Brechtiniana de “A Alma Boa de Setsuan”, com a atriz Denise Fraga.

Muitos espetáculos aportaram por aqui no mês de maio. O período atípico teve direito a decepção dos fãs do balé clássico, com a ausência em cima da hora da bailarina Ana Botafogo na apresentação do Ballet do Theatro Municipal do Rio de Janeiro. A inovação da dança contemporânea com “Geraldas e Avencas”. E as excelentes montagens trazidas pelo Festival Sesc Palco Giratório que em sua terceira edição, se firmou como um dos principais Festivais de Artes Cênicas do circuito pernambucano.

Entre os globais que passaram pelos palcos da Cidade, Wagner Moura dividiu opiniões com seu “Hamlet” meio higth tech, meio esquizofrênico. Bruno Gagliasso e Thiago Martins lotaram o teatro de menininhas histéricas, mas apresentaram uma encenação colegial. E Reynaldo Gianecchini, ao lado de Alessandra Maestrini, conseguiram divertir o público com um “Doce Deleite” não tão magistral quanto a primeira versão (com Marília Pêra e Marco Nanini), mas ainda assim satisfatório.

No quesito comédia, assistimos a tudo que há de disponível no mercado. Dos “Stand Up Comedys” de quase todos os integrantes do CQC, até os esquetes, popularizados pelo Youtube, dos Melhores do Mundo e da Terça Insana.

Entre os fatos marcantes da cena local, vimos o debut na direção teatral do cineasta Léo Falcão, que nos brindou com a bela montagem do espetáculo “Carícias”. Assistimos também ao terceiro espetáculo montado pela Cia. do Ator Nu, “Encruzilhada Hamlet”, um primor de cenografia e trilha sonora. O teatro de Santa Isabel - um dos principais equipamentos da cidade - passou a ser dirigido pela produtora cultural Simone Figueiredo, e voltou a receber a visitação do público. De triste, perdemos um dos nossos maiores ícones da dança popular, o mestre do frevo, Nascimento do Passo.
Fechando o ano, o Festival Recife do Teatro Nacional comprovou a velha máxima de que menos é mais. O festival veio com um orçamento bem contido, prezando enxugar ao máximo tudo que podia. Ainda assim, a prefeitura conseguiu realizar um evento rico: a curadoria de Kil Abreu foi certeira esse ano, trouxe experiências ímpares de teatro contemporâneo, a exemplo de “In On It” e “Rainha[(s)] - Duas Atrizes em Busca de um Coração”. A abertura experimental com teatro de rua, levando o Grupo Galpão à Praça do Arsenal da Marinha. O único pecado foi por conta da própria cena teatral do Recife, que fez feio não comparecendo às oficinas disponíveis, mesmo tendo preenchido todas as vagas.
* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 28/12/2009

Arte de experimentar

Peças criadas com cano de PVC ganham status no exterior

Quando começou a atuar no mercado de luminárias, o artista plástico Isnaldo Reis não tinha muita certeza de que sua experimentação seria bem sucedida. O arquiteto vivia uma fase criativa que o distanciava cada vez mais do “tradicional” de sua profissão. Isnaldo pensou em um produto artístico que usasse como base uma matéria-prima inusitada (há dez anos, bem inusitada): canos de PVC.
Durante alguns meses, quando começou a trabalhar na criação de suas primeiras peças, ele lançou mão de várias técnicas até chegar a um denominador comum em sua arte. “Tentei derreter os canos com ferro de soldar, usar brocas, serras. Era tudo na base do erro e da tentativa. Levei um tempo até conseguir entender a resistência do material e a intensidade correta a ser aplicada”, explica o artista.

O tempo passou e o trabalho evolui. As luminárias criadas por Reis ganharam o mundo e tornaram-se “produto tipo exportação”. “Exportamos para os Estados Unidos, França, Alemanha e Portugal regularmente. Além de clientes de outros países que levam peças avulsas. Por ano, em média, exportamos cerca de 500 peças aos todo”, diz.

O trabalho do artista também amadureceu ao longo desses dez anos. A riqueza de detalhes e o acabamento estético que tornou o desing das luminárias de Isnaldo conhecidas em todo mundo continuam presentes em seu trabalho. Entretanto, é possível perceber que as peças estão cada vez mais elaboradas, com entalhes maiores, tubos sobrepostos, pinturas monocromáticas. “Eu preciso estar sempre criando novidades, coisas diferentes. Um artista que expõe com frequência em feiras especializadas precisa ter essa consciência”, destaca o artista plástico, que a cada seis meses costuma expor suas peças na “Gift Fair” uma das maiores feiras especializadas em artesanato do País, que acontece em São Paulo.

Além das já populares luminárias, o arquiteto começa a expandir o seu nicho de atuação fazendo o reaproveitamento das sobras de material que utiliza em suas esculturas. As placas e os canos podem ganhar as aplicações mais diferenciadas, passando desde esculturas de parede, excelentes para decoração de ambientes externos, até mesmo pequenos acessórios como porta-guardanapos, bandejas, porta-copos, bijuterias, entre outros.

Serviço
Isnaldo Reis Designer
Rua Faustino Porto, n° 537 - Boa Viagem
Contato: 3302-3108 / 99740986
www.isnaldoreis.arq.br
* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 08/12/2009

terça-feira, 8 de dezembro de 2009

Antúlio Madureira grava DVD ao vivo no teatro Guararapes

As filmagens começaram desde o dia 2, com cenas externas

Em uma semana musicalmente privilegiada para o público pernambucano, depois de assistir Elza Soares, Arnaldo Antunes, Antônio Carlos Nóbrega, entre outros nomes, no show que marcou as comemorações do Dia Nacional dos Direitos Humanos, e antes de acompanhar a gravação do próximo DVD da Nação Zumbi (amanhã no Marco Zero), outra gravação inédita também vai chamar atenção dos amantes da música de qualidade. Trata-se da gravação do 1° DVD (Teatro Instrumental) da carreira do multi-instrumentista, Antúlio Madureira, que acontece hoje (8), às 21h, no teatro Guararapes. Com única apresentação aberta ao público.

As filmagens do trabalho, na verdade começaram desde o último dia 02 de dezembro com a gravação das cenas externas, nas quais o personagem do Velho Maribau, um mendigo tocador, inspirado no bumba meu boi, vivido pelo próprio Antúlio começa sua andança em busca do sonho de tocar para um plateia. A apresentação de hoje registra justamente o momento em que o artista encontra o palco." Depois da apresentação o maestro da Orquestra o convida para ser um de seus solistas. Este é o momento máximo do sonho", conta Antúlio, que assina a direção artística e o roteiro do DVD.

O projeto é um desejo antigo do artista que se tornou conhecido, principalmente, pela criação de instrumentos musicais inusitados, feitos em sua maioria, com materiais como latas, garrafas e afins. " Realizar esse projeto é um sonho antigo, mas nunca conseguia captar recursos suficientes para executar as gravações. Agora, com a ajuda dos amigos e de muitos parceiros, finalmente consigo realizar esse desejo".

Com produção, cenário e iluminação extremamente bem cuidados, e acompanhados de perto pelo próprio Antúlio, o espetáculo reúne música e teatro em uma apresentação que explora todas as vertentes criativas do artista. " É um espetáculo completo e colorido. Com teatro música, bonecos, instrumentos e humor. É um espetáculo onde as pessoas poderão ver a música", destaca Antúlio.

Serviço

"Teatro Instrumental"
Gravação aberta do DVD de Antúlio Madureira"
Teatro Guararapes - Centro de Convenções
Hoje (8), às 21h
Ingressos: R$20 (inteira) e R$10 (meia-entrada)

Informações: (81) 3088-3367


* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 08/12/2009

segunda-feira, 7 de dezembro de 2009

O camaleônico, agora mais contido

“Um anjo elegante do inferno”. Os versos da canção de Zeca Baleiro seriam os melhores para definir o Ney Matogrosso, do novo cd “Beijo Bandido”.Quem esteve no teatro Guararapes, na última sexta-feira, teve a chance de entender porque Ney é um artista como poucos. Camaleônico, no melhor sentido da palavra. Depois da explosão de cores e performances da turnê “Inclassificáveis”, Ney agora surge no palco mais contido, porém não menos grandioso. Com um show minimalista, Ney atinge o equilíbrio perfeito entre a sutileza de sua voz, e a acidez de sua interpretação.

De paletó bem cortado, forrado em cetim vermelho, salto e cara limpa, Ney dá início a sua apresentação cantando “Tango pra Tereza”. A música que foi um dos sucessos do começo de sua carreira, era um prelúdio do setlist que estava por vir. Boleros, Valsas e Tangos nunca pareceram tão atuais. Os clássicos “Da Cor do Pecado” e “Fascinação” vieram na seqüência, antecedendo o “boa noite”, discreto, que Ney deu a platéia. Em contrapartida, o cumprimento foi acompanhado de gritos histéricos de “gostoso” e “Eu te Amo Ney” que ecoaram no teatro.

E os elogios parecem acarinhar a alma de Ney. Entre uma música e outra, as caras e bocas (sua marca registrada) ainda estavam lá, para quem pudesse duvidar que realmente o assistia. O clima também era bem propício para o charme de Ney. No palco intimista, apenas com a presença da exime banda de cordas formada pelos músicos Leandro Braga (piano), Lui Coimbra (violoncelo e violão), Ricardo Amado (violino e bandolim) e Felipe Roseno (percussão) e um telão que fazia projeções diversas - inclusive do próprio Ney dançando como acontece na música “De Cigarro em Cigarro”, um dos melhores momentos do show – é o talento vocal de Ney que deve ser reverenciado.

Outro momento apoteótico do show aconteceu em “Bicho de Sete Cabeças”. A combinação voz e bandolim fez o público vibrar, transformando o momento em um dos mais poéticos da apresentação. Não desmerecendo, claro, a interpretação magistral de “Não Faça Assim” e “Segredo”. Finalizando um show repleto de nuances e silhuetas encantadoras, Ney voltou ao palco para um bis ainda mais dramático com “Incinero” e “Mulher Sem Razão”, numa apresentação que apesar de curta, durou o bastante para torna-se inesquecível.

quinta-feira, 29 de outubro de 2009

A dança rende-se a novos espaços

Entre os destaques da temporada está o Festival Internacional de Dança do Recife

Uma das principais marcas da XIV edição do Festival Internacional de Dança do Recife tem sido romper as barreiras do palco e ocupar espaços diferenciados que aproximam a linguagem da dança do grande público. Ao longo da programação foram apresentações em sinais de trânsito, praças, e parques da cidade. Agora, rumo à reta final, a programação se intensifica ainda mais e ocupa outros lugares inusitados.

Hoje e amanhã, a partir das 17h, a Casa da Cultura será palco do espetáculo “As Partes do Todo”, da Cia. Solo do Outro. A apresentação faz uma investigação corporal que tem como inspiração criativa a história do local, que já foi uma casa de detenção. Não muito longe dali, na Praça do Diário, a escola Guerreiros do Passo presta uma homenagem ao mestre do frevo, Nascimento do Passo, falecido há pouco mais de um mês.

A Cia. Solo do Outro encarou o desafio de ousar ainda mais em suas montagens, e no sábado, às 10h, apresenta o espetáculo “Eu Tava Passando e Resolvi Sair” em meio à confusão do Mercado de São José. A bailarina e coreógrafa Flávia Pinheiro utiliza cores, cheiros, formas e rostos do mercado na composição de sua apresentação. Identidades anônimas se misturam em um espaço democrático de segregação social. A anomalia da cidade é retratada a partir da perspectiva de um dia comum. “Desde o começo pensamos em como interferir no espaço, reorganizando-o. Fomos muitas vezes ao mercado, e acabamos nos tornando parte dele. É muito interessante poder interagir com diferentes histórias”, afirmou Pinheiro.

Outros espaços da cidade também serão tomados pela dança. No sábado, o Nascedouro de Peixinhos recebe a “Mostra de Dança e Cultura Árabe”. A praça do Hipódromo, no bairro de Campo Grande, recebe um aulão de frevo com os Guerreiros do Passo. E uma roda de breaking dance vai tomar conta do Clube do Bolinho, no Alto José do Pinho.

Porém, a grande apoteose dessa integração “dança e público” deve acontecer amanhã e sábado na Rua da Moeda. Um grande palco montado na rua vai dar oportunidade para qualquer pessoa da plateia que queira mostrar que também sabe dançar. Com uma ajuda de um DJ, que deve coordenar as apresentações, talentos poderão ser revelados, provando que o Festival de Dança do Recife tem espaço para todos os ritmos e todas as tribos.

Nos Palcos

Seguindo a programação principal dos teatros o destaque de hoje é o Grupo Grial, que apresenta o espetáculo “Castanha sua Cor”, às 19h, no teatro do Parque. O espetáculo propõe um mergulho no subterrâneo da Cultura Brasileira, proporcionando reencontros com antigos mitos. Amanhã, a carioca Micheline Torres apresenta o espetáculo “Carne”, às 22h, no teatro Hermilo Borba Filho. No sábado, a companhia mineira “Primeiro Ato” encerra a programação do Festival e apresenta o espetáculo “Mundo Perfumado”, às 21h, no teatro de Santa Isabel. Com uma narrativa não linear, a apresentação explora o corpo do bailarino como meio e mensagem. A programação completa do XIV Festival Internacional de Dança do Recife está disponível no site da Folha Digital.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 29/10/2009

Festival de Dança começa hoje

De hoje até o próximo dia 31 de outubro a cidade não vai parar de dançar. Isso porque, logo mais a noite, vários espaços serão tomados pelas ações do 14° Festival Internacional de Dança do Recife (FIDR). Nesta edição o Festival reverencia o ano da França no Brasil, trazendo, entre as muitas atrações internacionais, três espetáculos de companhias francesas. A abertura do evento fica por conta da cia. Malka, que apresenta o espetáculo “Meia Lua”, a partir das 21h, no teatro de Santa Isabel.

Um pouco antes da abertura, às 18h30, em frente ao teatro, uma grande roda de Hip Hop vai servir de convite aos passantes, e aquecer o público que estiver chegando para assistir à apresentação. A descentralização do Festival não vai parar por aí, na edição em que os realizadores prometem levar a dança a outros espaços, as apresentações do festival também vão invadir os sinais de transito e até mesmo as paredes dos prédios do Recife.

Desde hoje cedo, várias intervenções chamaram a atenção dos passantes em várias partes da cidade. O segmento FIDR na rua programou dois tipos de ações: “Sinais de Dança” e “Videocidade”. A primeira delas com bailarinos de dança contemporânea e de Hip Hop se apresentando nos sinais de trânsito das avenidas mais movimentadas do Recife. enquanto os sinais estiverem fechados, os artistas apresentarão suas performances ao som de motores e buzinas.

Já com a mostra “Vídeocidade” os pedestres terão acesso aos vídeos dos principais espetáculos de dança do festival, projetados nas paredes das avenidas. Os primeiros vídeos serão projetados nas paredes da Av. Conde da Boa Vista, próximo ao cruzamento da Rua do Hospício. O Vídeocidade prossegue nos dias 26, 28 e 30 de outubro, no Parque 13 de Maio, Av. Agamenon Magalhães e Pina, respectivamente.

Dona Flor traz novidades para palco da UFPE

Faz pouco mais de um ano que a montagem de um dos maiores clássicos da literatura brasileira, “Dona Flor e Seus Dois Maridos”, passou pelos palcos do Recife. Agora, o espetáculo, que faz uma adaptação da obra de Jorge Amado, retorna à cidade comemorando dois anos de sucesso de sua temporada pelo Brasil, e com mudanças no elenco. A maior delas, é relativa à personagem principal do triângulo amoroso mais conhecido da história. Florípedes (a Dona Flor), antes interpretada por Carol Castro, agora ganha vida na pele de Fernanda Paes Leme, que ao lado de Marcelo Faria (Vadinho), e Duda Ribeiro (Theodoro), dá à peça um tom ainda mais apimentado.

“Com a entrada da Fê começamos a fazer um desenho novo para o espetáculo. A nova Flor é mais alegre e espevitada. Isso também fez com que o Vadinho ficasse mais safado. Apesar da estrutura da montagem ainda ser a mesma, estamos mais leves, mais soltos mesmo” afirmou Marcelo Faria, que também assina a produção da montagem.

Outra novidade no elenco é a entenda do ator Jonas Torres no papel de Mirandão, amigo de Vadinho. “Mesmo com as mudanças continuamos bastante afinados com o texto. Ensaiamos em todo lugar que chegamos, repassamos a parte musical do espetáculo... tem sido uma ótima experiência” destacou o ator.

E de fato “Dona Flor...” se confirma como uma dos grandes sucessos teatrais da história recente. Ao todo, a montagem já soma 44 cidades visitadas, e um público na casa dos 210 mil expectadores. Números impressionam dentro do cenário das artes cênicas.

Serviço
“Dona Flor e Seus Dois Maridos”
Teatro da UFPE - Cidade Universitária
Sábado, às 21h, e Domingo às 20h
Ingressos: R$ 60 (inteira) e R$ 30 (meia-entrada)

Informações: 3207-5757

segunda-feira, 12 de outubro de 2009

P.P.P (des)congelando mentes

Poucos artistas conseguem alcançar uma maturidade criativa a ponto de permitir-se viver uma situação limítrofe de controle - ou melhor dizendo da falta dele - sobre sua obra. É preciso ter segurança absoluta pra mostrar-se falho. Factível de erro. Algo que a grande maioria dos artistas tenta evitar, ou pelo menos esconder. Philippe Ménard não teme. Expõe-se visceralmente, ao longo dos quase 60 minutos de duração do espetáculo P.P.P (Cia. Non Nova), que apresentou no teatro de Santa Isabel no último final de semana, em duas apresentações com casa lotada.

Em sua batalha cênica contra um inimigo perecível, o gelo, Ménard vai aos poucos revelando ao público todas as suas “personas”. Para narrar a sua experiência pessoal, Philippe se expõe como artista, pondo em cheque a sua técnica precisa, arriscando-se em malabares com bolas de gelo. A exposição é ainda maior como ser humano, que enfrentou todos os conflitos e inquietações de não se reconhecer no próprio corpo (uma mulher no corpo de um homem), e encontrou na arte uma maneira de exorcizar seus fantasmas.

No palco, Menárd nos convida a mergulhar em seu universo complexo e conflituoso. Apartir daí, percebemos que todos nós também travamos nossas próprias batalhas. Usando uma iluminação sombria, e com a ajuda de sons repetitivos e difusos, presentes na trilha de “P.P.P”, o artista cria uma atmosfera hipnotizante. Num misto de perfeição plástica, que é bela e agoniante.

Curioso perceber que todos os seus personagens começam serenos e vão, aos poucos, tornando-se intensos e perturbados. Quase que como se não coubessem em si. Passando pela criança ingênua, a descoberta da sexualidade, a rejeição ao corpo e a descoberta da leveza feminina, Ménard constrói sua narrativa em cima da desconstrução, da condição perene de mudança. Até seu próprio cenário vai desfazendo, do teto, bolas de gelo caem e se despedaçam, numa menção a urgência do tempo.

Ao final, Ménard volta a condição que ele repeliu durante toda sua vida. Despe-se e revela-se homem. Deixando a plateia atônita. Entre opiniões divididas alguns aplaudiam, enquanto outros deixavam o teatro desconfortáveis. Confirmando que o objetivo do artista foi alcançado. Todos saíram dali diferentes, de certa forma.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 12/10/2009

sábado, 10 de outubro de 2009

O Gelo que transforma

Cia. Non Nova apresenta em “P.P.P” uma metáfora para a transformação

Philippe Ménard é, por si só, a representação absoluta do processo transitório constante presente na vida de qualquer ser humano. Não me refiro apenas ao fato de Philippe ter nascido com o sexo masculino, e ter se tornado mulher. Mas, sim, ao fato de, como artista, e como pessoa, estar sempre buscando uma perspectiva diferente para enxergar o mundo. Seu objetivo foi alcançado em “P.P.P.”, espetáculo que a Cia. francesa Non Nova - fundada por Ménard - apresenta hoje (10) e amanhã (11), às 21h, no teatro de Santa Isabel dentro da programação do Festival de Circo do Brasil. Usando o gelo como principal matéria-prima na composição do seu cenário, o elemento tem um papel que vai muito além de meramente cênico. O gelo é o fio condutor de uma história de mudança de estado, é parte da metamorfose apresentada pelo artista.

A abreviação que dá nome ao espetáculo vem do francês Position Parallèle ao Ploncher - Posição Paralela ao Chão, em uma referência a única posição comum a qualquer pessoa: a do leito de morte. “ A escolha do título lembra que todos acabam da mesma forma. Podemos ter medo, não aceitar, mas o fim é inevitável. O mais interessante é o caminho que percorremos até chegar a ele. O espetáculo fala sobre a utopia do ser humano que luta sempre contra a própria morte, mesmo sabendo que não vai vencer O gelo representa essa luta fictícia, sabemos que no final, inevitavelmente, ele vai derreter”, explica Ménard.

Mas a escolha de trabalhar com uma matéria perecível não foi proposital. “Até hoje não tenho certeza de que o gelo é ideal para essa construção”, brinca o artista. Na verdade, esse encontro se deu casualmente, enquanto Ménard fazia uma turnê pela África. Na ocasião, um dos teatros onde o artista se apresntou não possuía sistema de refrigeração, e uma opção oferecida foi colocar barras de gelo em frente aos ventiladores. “ A temperatura estava em torno de 48 graus, e é claro que o gelo derreteu rapidamente, a água invadiu o palco e arrastou pedaços de gelo que sobraram. A plateia acabou achando que aquilo fazia parte do número, e percebi que podia usar isto de alguma forma”.

É claro que a escolha foi um desafio. Durante o processo de concepção a artista se machucou bastante em função da dificuldade imposta pela temperatura e dureza do gelo. Mas ainda assim, as limitações físicas não foram maiores do que as psicológicas. “Tive que reprogramar minha mente. Fiquei conhecida pela minha técnica perfeita e quando comecei a trabalhar com o gelo toda a minha perfeição sumiu. Tive que aprender a deixar de lado minha virtuosidade e aceitar me expor de uma outra forma” lembra.

Apesar de “P.P.P.” parecer, a princípio, um espetáculo autobiográfico - já que Ménard expõe situações pessoais como aceitação do corpo e suicídio - a artista destaca que a montagem fala de todas as pessoas que viveram uma experiência de mudança profunda. “ Escrevi o espetáculo para que o público possa viver algo diferente, porque acredito que o teatro é o espaço para isso. A intenção é fazer como que o espectador termine o espetáculo se sentindo diferente. Algumas pessoas vão ver apenas um número com gelo, outras vão se emocionar, outras vão voltar a infância. Não tento explicar nada. O mais importante é deixá-los livres”.

A Fantástica Fábrica de Gelo

Montar toda a estrutura que compõe o cenário de “P.P.P” não é tarefa fácil. Ao todo são 350 bolas de gelo de diversos tamanhos, além de congeladores, blocos de gelo e até mesmo um tapete branco, fabricado com raspas de gelo, estão em cena junto com Philippe Ménard. Toda essa megaprodução só é possível graças a uma equipe de cinco franceses, liderada pelo artista plástico Rodoph Thibaud, que assina a cenografia do espetáculo.

Thibaud explica que todo o processo é bastante complicado, e exige muito tempo e organização. Temperatura, clima, altitude, e até mesmo a pureza da água da cidade onde se apresentam, interfere no resultado. “Temos que fazer testes antes de começar a produção, porque tudo influencia no resultado do nosso trabalho”, explica o artista plástico.

Para dar conta do recado, 10 freezers de 400 litros, cada, foram instalados nos bastidores do teatro, e durante cinco dias ininterruptos a equipe trabalhou para deixar tudo pronto para a estreia. Para que tudo dê certo, até a entrada do público no teatro precisa ser cronometrada. “Todas as pessoas precisam estar acomodadas em cinco minutos, do contrário, o cenário começa a derreter” diz Thibaud. Portanto, não atrasem.


* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 10/10/2009

Começa o Festival de Circo no Recife

Foto: Jedson Nobre
Algo de Charles Chaplin esteve presente na abertura da quinta edição do Festival de Circo do Brasil. As atrações que subiram ao palco do teatro de Santa Isabel, na noite de ontem, mostraram mais que um show de talento e técnica. Foi a sensibilidade do corpo, a pantomima no seu mais puro sentido, que falou mais alto. O mestre de cerimônias João Artigos anunciou o que estava por vir. “Estou aqui para fazer um convite para uma noite inesquecível”, disse enquanto entretia o público com suas tortas acrobacias.

E ele estava certo. Quando o mineiro Luís Sartori deu início a apresentação do número “Carton” o público mergulhou em uma outra dimensão. Ainda que a plateia recifense ainda não esteja completamente pronta para experiências desse tipo, aos poucos, Sartori conquistou os olhares deslumbrados com a simplicidade de suas bolinhas, que surgiam em meio ao cenário de papelão. “Carton” foi um belo preâmbulo do que ainda estava por vir.

Na sequência, a cia. francesa Akoreacro apresentou o surpreendente “Pfffffff”. Acrobacias, malabares e números de precisão absoluta, foram apenas a cereja do bolo, em um espetáculo no qual música, teatro, circo e dança se misturam e se complementam de uma forma indivisível. Instrumentos musicais transformam-se em artifícios circenses e os corpos dos artistas narram uma empolgante disputa amorosa. Sob palmas, risos e suspiros da plateia os artistas começaram a fazer história no Festival que começa grandioso.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 09/10/2009

Todas as expressões de um novo circo

Festival dá início a uma programação de 10 dias com atrações do Brasil e da França

Está dada a largada para quinta edição do Festival de Circo do Brasil, que promete movimentar a cidade pelos próximos 10 dias. Quem estiver passando hoje pelo centro da cidade por volta das 11h30 vai perceber uma movimentação diferente nas paredes dos prédios da Avenida Conde da Boa Vista. A trupe paulista Acrobático Fratelli é a primeira atração a se apresentar dentro da vasta programação que o Festival vai oferecer (ver matéria página cinco). Não muito distante dali, logo mais à noite, o teatro de Santa Isabel recebe a partir das 21h, a abertura oficial do evento que terá o carioca João Artigo, da Cia. Teatro de Anônimo, como mestre de cerimônia. Além de apresentações de espetáculo nacional, e outro de uma companhia francesa, celebrando o ano da França no Brasil, marca desta edição do Festival.

Abrindo os trabalhos no palco, o mineiro Luís Sartori, apresenta o espetáculo ‘Carton’ (papelão em francês). Atualmente morando em Bruxelas, na Bélgica, Sartori tem formação em Belas Artes pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Foi durante o curso em “Artes do Espetáculo e Técnicas de Difusão e de Comunicação” (especialização em artes do circo) pela Ecole Supérieur des Arts du Cirque (ESAC), que o artista teve a oportunidade de aprofundar sua técnica circense. Hoje, Sartori divide seu tempo entre as atividades como malabarista, acrobata, ilustrador, artista gráfico, intérprete e baterista. Apesar da infinita gama de talentos, ele foge do ‘rótulo’ de multiartista. “Me considero um artista e dentro dessa condição tenho a possibilidade de desenvolver diversas técnicas. Estou sempre tentando experimentar, fazer algo diferente”.

Com ‘Carton’ Sartori brinca com as referências ao cotidiano e as surpresas que ele reserva. O público é convidado a entrar em um universo onde os objetos ganham vida, são manipulados e manipulam o próprio artista. “ Tudo começou a partir da única imagem de uma bolinha entrando em cena sem ser tocada, aos poucos essa ideia foi ficando bem maior”. Em um cenário todo feito em papelão, concebido pelo próprio artista, Sartori mistura malabarismo, acrobacia, dança e teatro, confirmando as várias facetas do artista. “O papelão dá ao número um tom mais lúdico que conquista tanto os adultos, quanto as crianças. Isso é interessante porque fiz ‘Carton’ pensando em mim. Fico muito feliz que o espetáculo tenha conseguido tocar públicos tão distintos”, ressaltou Sartori.

Música, Teatro e Circo num só espetáculo

A grande expectativa da noite de abertura do Festival fica por conta da companhia francesa ‘Akoreacro’ que apresenta pela primeira vez no País, na América Latina, o espetáculo “Pfffffff”. Reunindo técnicas tradicionais de números de rua e de picadeiro, com aquilo que existe de mais contemporâneo no circo francês, a companhia promete apresentar ao público recifense um jeito diferente de se fazer circo.

Criada em 2001 por Maxine Sole, Basile Narcy, Clair Aldedaya e Romain Vigier, todos artistas formados por escolas de circo de Estocolmo, Bruxelas e Moscou, a Akoreakro tem “a mistura” como princípio básico da criação de suas apresentações. Em seu novo espetáculo, juntaram-se a quatro músicos e transformaram a montagem numa verdadeira orquestra-circo. A trilha sonora pop de “Pfffffff” reúne ritmos dos mais eruditos, até os mais modernos como hip hop e o beat box (termo referente à percussão vocal usualmente feita pelos cantores de Hip Hop que dá nome ao espetáculo). “ Cada músico tem uma influência especial no espetáculo. Música clássica, tango, música judaica e até o próprio hip hop, cada um trouxe sua própria referência. Usamos a música como forma de trazer a modernidade para o circo”, explicou Sole.

No palco, entre acrobacias, música e números de malabares com instrumentos, o grupo encena duas pequenas histórias. A primeira delas acerca de uma ave que em seu leito de morte, pede a um gato que tome conta de seu ovo. Numa espécie de metáfora sobre as relações humanas. Na segunda história, sete homens disputam a atenção de uma mulher, provando a ela que cada qual tem suas vantagens: mais forte, mais bonito, mais hábil.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 08/10/2009

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

O deleite de uma carreira promissora

Sucesso nos anos 80, o espetáculo “Doce Deleite”, de Alcione Araújo, arrebatou o público da época a partir da interpretação magistral de Marília Pêra e Marco Nanini. A dupla dava vida a diversos personagens, em uma sequência de 12 esquetes, consideradas as precursoras do gênero besteirol. Hoje, quase 30 anos depois, os atores Reynaldo Gianecchini e Alessandra Maestrini (Toma lá dá cá) encaram o desafio de uma nova montagem, agora, com Marília assumindo a direção do espetáculo. Para saber um pouco mais da trajetória da peça, que já está há um ano e meio em turnê pelo País, o caderno Programa conversou com o ator, que falou sobre o processo de composição dos personagens, os desafios da montagem, e também sobre sua trajetória de ascensão como ator.

Quando surgiu o convite da Marília qual foi a primeira coisa que passou pela sua cabeça?
Eu tenho uma coisa comigo, que é muito do signo de escorpião, de ser movido a desafios. Quando surgiu o convite achei uma maravilha poder aprender com a Marília. Era um projeto irrecusável.A gente já vinha querendo trabalhar junto há muito tempo, só que nunca rolava. Mas logo depois que eu aceitei o convite é que a ficha caiu. Bateu aquele ‘Meu Deus! Eu nunca dancei, nunca cantei’. Mesmo assim topei o desafio. Quando surgiu o convite eu estava todo enrolado por causa das gravações da novela. Combinamos de esperar e durante esse tempo fui fazendo aulas de preparação de dança, e de canto, junto com a Camila (Morgado). Essa foi a melhor parte pra mim. A Marília nos acompanhava nas aulas de dança. Passamos oito meses muito juntos, nos conhecendo, e nos tornamos amigos.

Deu medo de fazer um papel que foi do Nanini?
Eu acho o Nanini um gênio. Nunca assumi isso pelo lado da responsabilidade. Não encaro pelo lado da substituição, acho que é uma honra poder ocupar esse lugar.

Quais são suas impressões em relação ao texto de Alcione. A nova montagem só repete três esquetes do texto original, mesmo assim elas ainda funcionam?
Na verdade são quatro esquetes daquela época. A primeira montagem tinha outros autores, agora só usamos textos do Alcione. Mas os tempos são outros. Lá era o começo do besteirol, o público era outro, os atores eram outros. Eu e a Camila somos atores diferentes e só com isso a mesma esquete já estimula reações diferentes. Para mim a peça é um grande borrão para gente brincar em cima. Somos dois atores brincando com a criação dos personagens, trazendo os recursos que temos enquanto atores para o mundo.

Qual é o maior desafio do espetáculo: cantar, dançar, ou dar vida a diversos personagens numa só montagem?
Tudo pra mim é um grande desafio. Eu interpreto sete personagens diferentes, todos com perfis de comédia distintos. Isso por si só, já é um desafio. Mas para mim o mais difícil de todos foi o canto. Foi o que me deu mais insegurança porque precisei partir do zero. Ao contrário da dança. Eu sofria muito nas aulas de canto. O aprendizado não fica tão evidente porque na música você trabalha músculos que estão por dentro, tudo é muito subjetivo.

Há pouco mais de dois meses a Camila precisou ser substituída pela Alessandra (Maestrini) isso interferiu de alguma forma no ‘time’ da peça?
A Camila acompanhou o processo desde o começo. A peça foi montada em cima da gente, das nossas percepções. Foi muito doloroso para todos nós quando ela precisou sair por causa das gravações. Mas não tinha outro jeito. A Alessandra se encaixou como uma luva. Ela já tinha a bagagem do canto lírico e também é comediante. Claro que a peça muda toda, mas foi gostoso porque ambas são muito boas atrizes.

Desde sua estreia em Laços de Família (2000), quase 10 anos se passaram. Como foi a experiência de passar de ator criticado a ator escolhido para protagonizar um espetáculo dirigido por um dos maiores mitos do teatro nacional?
É um processo de muito trabalho. É óbvio que qualquer profissional em início de carreira tem dificuldades, mas não sou de ficar acomodado. Isso não quer dizer que você vá acertar sempre, mas para mim, o mais importante é que eu dou sempre o meu melhor. Às vezes, claro, não é tão bom, e você é criticado. Mas o mais importante é ter respeito por esse trabalho e pela experiência que se pode tirar dele. Nesses 10 anos tive a oportunidade de aprender com muita gente boa.

No livro lançado com o texto da peça e entrevistas com você e a Camila, você fala que não te desanima o fato de saber que muita gente só vai ao teatro pra ver o galã da novela. Ao longo de mais de um ano de turnê com a peça, você tem sentido essa relação se modificar?
Realmente não me incomoda. Como cada público é diferente, quando você começa o espetáculo dá pra perceber que tem um monte de gente buscando o cara da TV. Isso muda ao longo do espetáculo. A peça é muito comunicativa, nós vamos ganhando as pessoas aos poucos. E no final, é realizador ver que todo mundo está envolvido com a gente.

Serviço:
“Doce Deleite”
Teatro da UFPE - Campus Universitário
Hoje, às 21h, e domingo às 20h
Ingressos: R$80 (inteira) e R$40 (meia) plateia / R$60 (inteira) R$30 (meia) balcão
Informações 3207-5757 / 3207-1144

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 02/10/2009

quarta-feira, 30 de setembro de 2009

Respeitável público, vem chegando o circo

Começa em outubro a quinta edição do Festival de Circo do Brasil

Outubro é o mês da criança, mas tanto os pequenos, quanto os mais crescidinhos vão poder comemorar a data desfrutando de toda a magia que só o circo pode oferecer. Entre os dias oito e 18 de outubro começa no Recife a quinta edição do Festival de Circo do Brasil. Ao longo de dez dias, uma vasta programação com companhias de circo do Brasil, e do exterior, vão movimentar vários pólos espalhados pela cidade. O Festival também marca as comemorações do ano da França no Brasil, e nessa edição vai contemplar as principais companhias de circo dos dois países.

“ Tentamos fazer um pequeno panorama do circo tradicional até circo contemporâneo francês. Ao todo serão seis montagens francesas e mais de onze atrações nacionais”, explica a coordenadora e curadora do evento, Dani Hoover. Há cinco anos à frente da organização do festival, Hoover destaca que a França é hoje um dos principais celeiros de talentos circenses, que conseguem dialogar com técnicas arrojadas e inovadoras. Em conjunção com os espetáculos nacionais, o festival vislumbra apresentar ao público um recorte de toda efervescência da produção de circo ao redor do mundo. “A proposta do festival é cada vez mais ampliar o horizonte do circo, e de como ele é visto pela plateia. Tivemos edições exclusivas de lona, de rua, e de palco. Queremos apresentar as várias expressões que o circo tem no mundo. Toda sua abrangência mesmo que de forma fragmentada. Estamos mostrando que o circo saiu da lona e ganhou outros espaços. É uma arte aberta a várias linguagens”.

Nomes de peso do cenário internacional farão, pela primeira vez, apresentações no país. As companhias francesas Cirque Fusion, Akoreacro e Non Nova, se apresentam em sessões exclusivas do Festival. Entre essas, destaque para um dos mais esperados espetáculos “P.P.P.”, da Non Nova, que vai colocar congeladores e bolas de gelo no palco do Santa Isabel, que serão manipuladas pelo malabarista Philippe Ménard. O espetáculo, que já passou por 60 países, e foi eleito um dos cinco melhores espetáculos pelo Culture France, apresenta toda a técnica e rigor da arte circense. “ O artista constrói uma performance de arte contemporânea, desde a concepção plástica, até a conceitual, que aborda o transexualismo, através da mutação das coisas”, explica Hoover.

Entre as crias da casa, o número do malabarista Luís Sartori, “Carton” será o responsável pela abertura do Festival. Uma da melhores companhias brasileiras, os pelotenses do grupo Tholl retornam à cidade com o espetáculo “ Imagem e Sonho”. Além disso, a intervenção do grupo Acrobático Fratelli, “Travessias Urbanas”, deve movimentar e chamar a atenção de quem passar pela Av. Conde da Boa Vista no dia da apresentação. A programação completa está disponível no site do Festival www.festivaldecircodobrasil.com.br.

Espaço para tradição

Apesar do recorte voltado para números que apresentam a vanguarda das artes circenses, a quinta edição do Festival de Circo do Brasil também terá espaço para as apresentações na linha mais tradicional. A Praça do Arsenal da Marinha, localizada no bairro do Recife, vai se transformar num grande picadeiro com três palcos que receberão vários espetáculos. No dia 12 de outubro, dia das crianças, uma programação especial com Banda Gigante(SP), Trio Zindare (FR) e Cirkologiom (FR) inaugura a temporada na Praça. Entre os dias 13 e 15, haverá na Praça do Arsenal, diariamente, apresentações de palhaços com os espetáculos “Pelo Cano” e “Jogando no Quintal”. Na sexta-feira, 16, o Circo Vox chega para compor o fim de semana de encerramento do Festival. Nos dias 17 e 18 de outubro, estará disponível na Praça do Arsenal uma série de equipamentos - cama elástica, arame, diábolos e malabares - que poderão ser utilizados livremente pelo público. Os franceses Trio Zindare, Triskel e Cirkologiom compõem a grade de programação. Outros locais também receberão espetáculos, como o Parque 13 de Maio e o Parque da Jaqueira.



“Cabaré Circense”

A boate NOX também será um dos roteiros dentro da programação diversificada do Festival. No dia nove de outubro a boate recebe a festa, que é uma tradição dentro dos festivais de circo no mundo todo, intitulada “Cabaré Circense. O evento vai receber apresentações dos grupos O Teatro Mágico e Acrobático Fratelli. Além de ter discotecagem do DJ Dolores, tocando músicas francesas, e DJ Jérome Pigeon - de uma das casas mais famosas de Paris a Favela Chic - pilotando as pic-ups com músicas nacionais. A festa ainda vai abrir espaço para que os artistas presentes façam apresentações espontâneas de seus números favoritos.


* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 30/09/2009

A adolescência não é limitada

Difícil a vida de um artista que vislumbra transitar por diferentes meios, mantendo sempre um trabalho de consistência. Conseguir êxito no cinema, e no teatro, quando se está impregnado por referências televisivas, talvez seja ainda mais difícil. O espetáculo “Aonde está você agora?”, exibido em três sessões totalmente lotadas (uma no sábado e duas no domingo) no teatro de Santa Isabel, é um bom exemplo dessa celeuma.


Protagonizada e dirigida pelo ator Bruno Gagliasso, que divide o palco com Thiago Martins, a montagem aproxima-se bastante de um clássico folhetim de novela das oito. O que não precisa ser de todo negativo, já que a grande maioria do público (feminino) - munido de máquinas fotográficas, e fazendo pedidos de telefone - estava ali para ver o “Tarso” (personagem de “Caminho das Índias”), independente do que fosse ser apresentado no palco.

Em sendo assim, a história de dois amigos que se conhecem ainda na infância, se separam na adolescência, e seguem caminhos diferentes, até um reencontro emocionado, é suficiente para fazer a plateia rir, e até chorar - “Tem gente chorando”, disparou o ator durante os agradecimentos - com o previsível fim.

Uma pena porque, de fato, tanto Bruno quanto Thiago, revelam-se excelentes atores técnicos. Convencem nos papéis de meninos de oito, 15, e 22 anos. O problema é que existe algo que não se encaixa em “Aonde...“. É um certo ranço de teatro colegial, possivelmente agravado pela trilha sonora do Legião Urbana. Nada contra “Vento no Litoral” - música que inspirou o espetáculo - mas um texto sobre adolescentes, não precisa, nem deve ser limitado.

A peça, que tem tom simplista, com apenas os dois atores em cena, um telão, e a iluminação, fica ainda mais comprometida em função do Santa Isabel. Com uma plateia verticalizada, o público acomodado nos camarotes laterais perdeu a capacidade de acompanhar as imagens projetadas no telão.

Não que ele fosse peça fundamental para o entendimento da história, mas talvez tenha ajudado na composição, e na ambientação dos personagens. No mais, foi bacana ouvir o Gabriel (Martins) entoando clássicos da Legião dos anos 1980, e ver o Pedro (Gagliasso) ensinando aos jovens a diferença entre sexo com amor, e somente sexo. Montagem bem educativa.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 28/09/2009


segunda-feira, 21 de setembro de 2009

Maior idade do deboche

Trupe do Barulho completa 18 anos de muito riso e casa cheia

Quando começaram apresentando um “pocket-show” na boate “Araras Dancing Bar” no início da década de noventa, os atores que viriam a formar a companhia de teatro “ Trupe do Barulho”, não podiam esperar que fariam uma trajetória de tanto sucesso nos palcos. O show de humor “Cinderela a História que sua Mãe não Contou” era baseado no escracho e tinha duração de 40 minutos. Em menos de um ano o púbico praticamente dobrou e a casa já não dava mais conta da demanda. Foi quando surgiu a ideia de estender o show e transformá-lo em um espetáculo para teatro.

Mas, subir aos palcos não foi tarefa tão fácil. O grupo, formado na época pelos atores Jason Walace, Aurino Xavier, Jô Ribeiro , Flávio Luiz, Ináldo Oliveira, Luciano Rodrigues e Edílson Ryggard, encontrou muitos obstáculos para conseguir que a montagem baseada no humor rasgado fosse aceita pelos teatros da Cidade. Chegaram ao teatro Valdemar de Oliveira, casa que acolheu o grupo, e os abriga até hoje. “Devemos isso a Reinaldo Oliveira, que nos abriu as portas com a condição de que a equipe estivesse de acordo. Graças a ele estamos lá até hoje”, relembra Aurino Xavier, um dos fundadores da companhia.

Estrearam no palco à 0h do dia 20 de setembro de 1991 com casa lotada. “ Tivemos uma recepção muito boa porque na época havia um ‘boom’ do movimento das dragqueens e retratamos exatamente esse universo. Nossa estratégia para atrair o público era dizer que o espetáculo tinha de tudo, mas o que acontecia é que estávamos contando uma fábula infantil de uma forma diferente. O que fazemos é brincar com a safadeza, usar a linguagem popular da forma que ela realmente é falada, isso nos aproxima do público. Não existe baixaria. O palavrão está dentro de um contexto”, destaca o ator.

Hoje, 18 anos depois, foi justamente o escracho e o deboche tão característicos da Trupe que os alçou a categoria de uma das mais antigas e bem sucedidas companhias de teatro do Estado. Ao todo, são 10 espetáculos no repertório de comédia do grupo, sendo apenas um deles voltado para o público infantil: “O Mistério das Outras Cores”.

É bem verdade que ao longo dessa jornada a Trupe sofreu algumas baixas. Ainda no final da década de noventa, Jason Walace, protagonista do principal espetáculo da companhia, deixou o grupo para apostar em novas possibilidades para seu personagem “Cinderela”. E em 1997, o falecimento de Edilson Ryggard - que dava vida ao personagem do príncipe do espetáculo - também abalou bastante o elenco. Porém, nada que apagasse o brilho e a vontade de fazer rir.

Em meio a uma trajetória controversa, e aquém do olhar atravessado dos críticos, que insistiam em torcer o nariz para o tipo de representação feita pela Trupe do Barulho, o grupo conseguia, ano após ano, renovar seu público e garantir o sucesso das bilheterias. Eduardo Japiassú, um dos atores do elenco de “Apareceu a Margarida” - montagem mais recente da companhia - lembra que ao entrar para a Trupe conseguiu pela primeira vez o reconhecimento dos fãs, mesmo depois de mais de 20 anos nos palcos. “ A relação do público com a trupe é o que existe de mais fascinante. Temos blogs, fã-clubes, e gente que não perde um só espetáculo”, Disse Japiassú.

O reconhecimento é o reflexo de um trabalho sério e profissional feito por todos aqueles que apóiam o trabalho da companhia. “ Fazemos um trabalho de pesquisa igual ao de qualquer outro grupo, temos compromisso e responsabilidade com nossos personagens. Com isso, conseguimos atingir todos os públicos. Nossa plateia não é segmentada, temos gente que vem de Boa Viagem, e do Auto do Mandu. Todos se divertem da mesma forma”, afirma Flávio Luiz.

HISTÓRIA

Entre alguns dos muitos sucessos que marcam a trajetória da Trupe do Barulho, “Cinderela - A História que Sua Mãe não Contou”, é sem sombra de dúvidas o espetáculo que teve mais repercussão no repertório da companhia. Tanto que foi o personagem que projetou Jason Walace a uma perspectiva Nacional. E fez do bordão “Ôxe Mainha” um verdadeiro hit.

O sucesso foi tanto que os atores costumam contar com orgulho um episódio no qual, certa vez, quando se apresentavam pelo projeto “Todos com a Nota” esgotaram a capacidade do teatro do Parque e levaram uma multidão à Avenida Conde da Boa Vista em busca de ingressos. A procura foi tanta, que forçou os organizadores do evento a agendarem uma nova apresentação. Dessa vez o local escolhido foi o ginásio do Geraldão que também teve sua capacidade esgotada e confirmou perante todos que a fórmula do riso e do deboche dá resultado.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 21/09/2009

A arte de projetar

Arquitetura como expressão artística reflete transição dos tempos

Já parou para pensar que sempre que queremos citar um exemplo de beleza arquitetônica fazemos menção a prédios antigos? Um erro recorrente, e que é usualmente repetido por pessoas em diversas áreas, é excluir a arquitetura do ramo das expressões artísticas, como se a mesma não representasse o mais puro significado de arte. Principalmente no que diz respeito à arquitetura contemporânea.

Porém, tanto quanto os estilos de outrora, os projetos modernos e pós-modernos também possuem o seu charme e estão carregados de significado e inspiração de seus projetistas. O fenômeno de incompreensão da arquitetura como representação artística começou a acontecer durante o Movimento Moderno. Prédios que antes eram repletos de ornamentos, a partir do século XX começaram a perder essa característica em função do paradigma “forma x função”. “Influenciados pelas artes plásticas, os arquitetos começaram a pensar projetos mais simples que tinham base na composição de volumes e cores, não mais na ornamentação”, destaca o Doutor em Teoria e História da Arquitetura pela Universidade da Cataluña, e professor da UFPE, Maurício Rocha.

De acordo com o professor, a arquitetura é uma arte cara, feita para ser vista e usada. Por esse motivo, durante o período das duas grandes guerras mundiais, uma de suas principais características - a ornamentação - foi abandonada pela necessidade de se reconstruir cidades inteiras de forma rápida e barata. “A perda do ornamento foi uma questão de ordem prática”, lembra Rocha.

Para entendemos melhor esse processo podemos traçar uma linha do tempo de edificações. No Recife, três construções servem como bom exemplo de fachadas ornamentadas. A igreja de São Pedro dos Clérigos (XVIII) tem características do Barroco, enquanto que o Teatro de Santa Isabel (XIX) apresenta características do Historicismo Neoclássico. O prédio do Palácio da Justiça (primeira metade do séc. XX) é caracterizado como um edifício eclético, que possui características de vários estilos, chegando ao máximo de ornamentalidade em um único espaço. A partir daí, os projetos começaram a seguir a tendência mundial trazida pelo Movimento Moderno, linhas mais retas e funcionais ditavam um estilo, que pode ser muito bem representado pelo edifício Acaiaca, na Avenida Boa Viagem.

Entre os projetos mais recentes, o Fórum Desembargador Rodolfo Aureliano (Joana Bezerra), pode representar alguns indícios do Pós-Modernismo na paisagem da cidade. Com uma estrutura menos rígida, a construção já permite a volta do ornamento. “Ainda temos pouquíssimos exemplos pós-modernistas pelo preconceito em torno do ornamento que foi criado pelo movimento moderno. No sul e sudeste já é mais comum encontramos a presença do adorno em correntes que podemos chamar de “retrô”, explica o professor. “O mais importante é entendermos que sempre que mudam os paradigmas as pessoas acreditam que a arte acabou, mas o que acontece é que a arte se adapta. Cada tempo tem sua arte, e ela representa o estilo de seu próprio tempo”.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 20/09/2009


Uma verdade cheia de “clichês”

Se existe um mérito para o novo filme do diretor Robert Luketic, “A verdade nua e crua” (The Ugly Truth, EUA, 2009), é o fato da narrativa de uma comédia romântica ser construída sob a perspectiva masculina de relacionamentos. Fato pouco visto em filmes do gênero. Apesar de ter uma mulher como protagonista da história - a produtora de TV obsessiva, controladora e solitária, Abby Richter, vivida pela atriz Katherine Heigl - a verdade que Luketic pretende expor são as mais profundas aspirações dos “machões” de plantão.

O problema é que para cumprir seu objetivo o diretor pesa na mão, e exagera na dose de “clichês” para retratar o universo dos machos alfas. Mike Chadway, interpretado por um dos atuais queridinhos de Hollywood, Gerard Butler, é o apresentador de um programa sobre relacionamentos especializado em dar conselhos para mulheres desesperadas, dispostas a aceitar qualquer tipo de opinião machista para conquistar um namorado. Depois de um embate com uma telespectadora revoltada, a própria Abby Richter, Mike é convidado a trabalhar na emissora de Abby, que passa a ser sua produtora. A missão de ambos: elevar os índices de audiência às custas dos conselhos de Mike. Ou seja, às custas de muita baixaria. Em paralelo, Mike também tem a missão de ajudar Abby a conquistar Colin (Eric Winter) A partir daí, o filme segue uma receita de bolo tão precisa que chega a ser tediosa. E claro que os dois vão acabar se apaixonando.

É bem verdade que alguns momentos rendem boas risadas, como a cena em que Abby usa uma calcinha com vibrador durante uma reunião de negócios. Mas apesar dos poucos momentos bem sucedidos, a fórmula usada é a mesma conhecida por todos. A ideia inicial de expor o “lado b” da relação acaba sendo descaracterizada, os personagens perdem seus traços mais extremados (que eram os mais interessantes), e tornam-se iguais a diversos outros já bastante íntimos do público. Reafirmando o conceito desgastado de que nesse gênero de filme, o que mais vale é deixar o espectador livre de surpresas.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 18/09/2009

segunda-feira, 14 de setembro de 2009

O ácido e o doce do homem

CENAS fortes ora constrangem, ora encantam o público

Escuta-se a campanhia anúnciando que o round de uma batalha vai começar. Como no boxe, combatentes se enfrentam numa batalha de palavras, ou da ausência delas. Mas esta é uma batalha de vencidos e vencedores que se dá no palco. “Carícias”, peça de estréia do cineasta Leo Falcão, que iniciou temporada sábado no Hermilo Borba Filho, nos leva a perceber o que há de mais delicado nas relações humanas: o próprio ser-humano.

Os conflitos entre pais, filhos, irmãos, namorados, amantes... são o principal foco no texto escrito pelo catalão Sergi Belbel. Porém, é na leitura feita por Leo, com ajuda da irmã Karina Falcão - assistente de direção - que a narrativa ganha outra dimensão. O Realismo Fantástico, traço estilístico mencionado pelo diretor, está presente, e se faz crucial para suavizar o peso de relações tão desgastadas e viciosas.

Em um tabuleiro de um jogo imaginário da vida, os personagens se revezam em situações comuns a todos nós. O casal que vive um casamento falido, a filha que não aceita ouvir verdades de sua mãe, o marido que enlouqueceu ao perder a mulher para outra mulher. Conflitos possíveis de verdades embaraçosas, difíceis de ouvir. As pessoas temem suas próprias verdades, e comunicar-se vira uma barreira intransponível.

O talento do elenco com Ana Cláudia Wanguestel, Carlos Lira, Cira Ramos, Marcelino Dias, Paula de Renor e Rodrigo Garcia são um atrativo a mais. Afinados com o diretor, eles dão leveza a assuntos difíceis. Cenas como a da banheira partilhada por pai e filho, ou a do rompimento dos amantes, ganham ares surreais pela verdade quase nunca dita. Ora constrangendo, ora encantando a platéia, que assiste a tudo como se fosse o vizinho que aponta as mazelas do apartamento ao lado, esquecendo de suas próprias.

“Carícias” com frescor de novidade

Um final de semana de estreias promete movimentar o mundo das artes cênicas na cidade. Duas grandes produções começam suas respectivas temporadas hoje, mas antes mesmo de colocar o resultado no palco (e por razões diferentes), já estão dando o que falar. Uma das grandes expectativas do sábado é o espetáculo “Carícias”, que marca o “debut” do cineasta Leo Falcão, à frente da direção teatral. A peça, que tem texto do dramaturgo catalão Sergi Belbel (com tradução da carioca Christiane Jathay), propõe uma viagem através das relações humanas e as situações limites com as quais nos deparamos em mundo que prima pela comunicação, mas no qual comunicar-se passou a ser um desafio.
Com uma carreira de mais de 10 anos no cinema, Leo Falcão, tem em seu currículo filmes como “Lugar Comum” (2002), “A Vida é Curta” (2008) e “Guia prático, histórico e sentimental da cidade do Recife” (2008). Agora, o diretor deixa sua zona de conforto, e se aventura em novas formas de expressão. “Eu estou experimentando outros meios narrativos, acho curioso como parâmetros expressivos funcionam em linguagens diferentes. O teatro é um ambiente rico para experimentar”, explicou o diretor.

O convite para dirigir o espetáculo partiu do elenco formado pelos atores Ana Claudia Wanguestel, Carlos Lira, Cira Ramos, Marcelino Dias, Paula de Renor e Rodrigo García. O grupo queria experimentar uma nova forma de fazer teatro, e, para isso, precisavam de alguém novo que topasse o desafio. A transição de meios ficou mais fácil com a ajuda da irmã, Karina Falcão, que assina a assistência de direção e preparação de elenco do espetáculo. “Eu o ajudei a fazer o link do estilo que ele já tem com o teatro. Foi tudo bem tranquilo”.
Para falar de relacionamentos, Leo Falcão faz uso da metaliguagem e coloca os atores em um grande tabuleiro. Durante rodadas de um jogo, as relações interpessoais vão se desenhando, e fica exposta a fragmentação existente no processo de comunicação do homem contemporâneo. O Realismo Fantástico, traço recorrente no trabalho do diretor, também se faz presente a partir da metáfora usada para tratar dos conflitos. “O texto é muito visceral, e podia pedir uma montagem mais realista. Mas optei por algo mais leve”, disse Falcão.

Serviço:
“Carícias”
Teatro Hermilo Borba Filho - Recife Antigo
Sábado (12), apenas convidados /
Temporada: sábados e domingos, às 20h
Ingressos: R$ 15,00 e R$ 7,50
Informações: (81) 3232-2030 3232-2028
* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 12/09/2009

Hamlet mais perto do povo no Barreto Júnior

No outro lado da cidade, mais uma estreia também promete causar furor entre os amantes do bom teatro. Trata-se de “Encruzilhada Hamlet”, terceiro espetáculo montado pela Cia. do Ator Nu, formada pelos atores Edjalma Freitas e Henrique Ponzi. Com texto e direção do dramaturgo João Denys, a peça faz um recorte de um dos textos mais conhecidos de William Shakespeare, entretanto é importante destacar que o espetáculo não é apenas uma adaptação da obra que retrata os dilemas do jovem príncipe dinamarquês. Em “Encruzilhada...” Denys propõe uma análise diferente acerca dos personagens de Hamlet e do Coveiro. Precisamente sobre as relações e tensões entre um representante do povo e um representante da nobreza, partindo de uma condição única: a de estarem sob a terra.

“Uso o Hamlet como matéria prima para a criação. Parti de um personagem existente, e de uma situação existente, para fazer cruzamentos e abusar da intertextualidade”, explica Denys. Em sua versão, os espíritos de Hamlet e do Coveiro aparecem em cena num túmulo de vidro. Como estátuas de mármore em um cemitério, inteiramente nuas e enterradas até o abdômen, as duas personagens encenam o conflito entre o grande e o pequeno, o rico e o pobre, o erudito e o ignorante.
Na construção da narrativa, o diretor ainda faz uso de citações de diversos dramaturgos que lhe serviram de referência ao logo de sua carreira nos palcos. Samuel Beckett, Lorca, Brecht, e até referências bíblicas são apenas alguns exemplos. “É como se eu estivesse dizendo aqui, como eu entendo teatro, como eu gosto de fazer teatro. Teatro para mim é poesia. Estou fazendo um inventário de mim mesmo”, afirmou Denys.

Serviço:
“Encruzilhada Hamlet”
Teatro Barreto Júnior - Pina
Sábados e Domingos, às 20h30
Ingressos: R$ 10 (inteira) e R$ 5 (meia-entrada)
Informações: 3232-3054
* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 12/09/2009

sexta-feira, 11 de setembro de 2009

Um encontro para mover o mundo das artes

Foto: Arthur Mota
Um projeto audacioso está em fase de gestação. O espetáculo “Daquilo que move o mundo” (nome ainda provisório) reúne três grandes nomes das artes cênicas de Pernambuco: Irandhir Santos, Jorge de Paula e Kleber Lourenço. Há um ano e meio, o grupo “Visível Núcleo de Teatro”, formado pelos três, vem ganhando forma enquanto trabalha na concepção e pesquisa de um o projeto que surgiu a partir de suas inquietações sobre o andamento do teatro contemporâneo, e com questões ligadas a estética e a necessidade de realização de um trabalho de pesquisa continuado.

No último final de semana os atores avançaram mais uma etapa no processo de produção do espetáculo. Os diretores Francisco Medeiros e Tiche Vianna vieram ao Recife com o objetivo de estreitar as relações com elenco, e aprofundar o processo de construção dos personagens. “Foi muito bacana esse encontro porque tivemos a oportunidade de fazer um trabalho bem intensivo. Os diretores entraram em contato com tudo que já fizemos ao longo desse tempo. Tiche também propôs alguns exercícios, e agora começamos a etapa que chamamos de treinamento físico dos personagens”, ressalta Kléber, que complementa: “Encaminhamos o nosso planejamento, e possivelmente em novembro. Nosso objetivo é estrear o espetáculo em março, estamos dependendo da captação de recursos”.

Desde que conceberam a ideia inicial do projeto, os nomes de Tiche e Francisco foram unanimidade, Além da admiração recíproca, foi determinante para o convite a característica do trabalho continuado que ambos já desenvolvem. “Minha investigação principal é o trabalho do ator, essa oportunidade já me foi tentadora por si só. Depois o fato de ser um trabalho autoral, na contramão do mercado e no Nordeste. Não tinha como não fazer, sou apaixonada por quem faz o caminho inverso”, diz Tiche, responsável pela preparação do elenco. Francisco Medeiros também resumiu o sentimento que o motivou a embarcar no projeto junto com o grupo. “Para mim o mais importante é a grande dose de insensatez, isso é o mais instigante”.
* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 10/09/2009

Cena Aberta leva teatro para as ruas de Arcoverde

Os cariocas da Cia Mystérios e Novidades apresentam “Ciclopes” na abertura do Festival

Município tradicionalmente conhecido pela riqueza de seus cordéis, cantadores, poetas e repentistas, Arcoverde pode ser considerado um dos grandes berços de talentos do Sertão de Pernambuco. Artistas consagrados, a exemplo de Lirinha, do Cordel do Fogo Encantado, saíram de lá para levar o nome da cidade para o resto do País. É com base nessa tradição cultural que Arcoverde dá início, a partir de amanhã, ao primeiro Festival Cena Aberta - Semana Geraldo Barros. A mostra vai receber grupos de teatro do Acre, Rio de Janeiro, São Paulo, Rio Grande do Norte, Pernambuco, e até da França. O objetivo é apresentar espetáculos em diferentes espaços abertos da cidade, com intuito de sensibilizar as autoridades responsáveis para a total ausência de um equipamento público voltado para a atividade teatral no município.

“Estamos levando o Festival para espaços alternativos porque o único teatro da cidade está em obras há 20 anos. A obra foi embargada pelo Ministério Público e até agora a população não teve acesso a esse espaço”, explicou o coordenador do Festival, Romualdo Freitas. Mas mesmo diante da restrição de possibilidades, a causa maior que motivou a realização do Festival foi a vontade de levar uma programação teatral de qualidade para população que não costuma ter esse tipo de contato. “O benefício maior é para os arcoverdenses. Mas não apenas para eles, queremos mostrar que é possível levar um bom teatro mesmo para lugares que não dispõem de uma estrutura específica”, destacou Romualdo.
Além dos espetáculos teatrais, a programação ainda inclui oficinas, entre elas uma oficina de “clown” com a companhia francesa “Cie Du P’Tit Doigt” - que faz apresentações no Estado em função do ano da França no Brasil - exibição de documentários, shows, e dois colóquios que vão discutir “A Cadeia Produtiva da Arte” e “As Artes Cênicas e Seus Espaços de Representação”, com participação de representantes do Ministério da Cultura, Fundarpe, Prefeitura e Movimento Cultural de Arcoverde, entre outras atividades.

Entre alguns dos espaços da cidade que o Festival vai ocupar estão o Presídio Brito Alves, Galpão da Estação da Cultura, Largo de São Geraldo, Praça da Bandeira, Escadaria e Canteiro de Obras do Sesc. O Festival Cena Aberta acontece até o dia 20 de setembro. A programação completa da mostra está disponível no site da Folha Digital.



* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 10/09/2009

quinta-feira, 10 de setembro de 2009

Histórias de lá e de cá

Espetáculo teatral teve montagem holandesa e agora ganha a sua versão pernambucana

Foto: André Martins
Uma viagem no tempo de volta à época da presença holandesa em Pernambuco. O universo do conde Maurício de Nassau, a influência que sua presença exerceu sobre o Recife, e o seu envolvimento emocional com a cidade estão retratados no espetáculo “Histórias de Além-Mar”, que estreia hoje sua miniturnê, em Goiana, no Cine Teatro Polytheama, circulando ainda por mais cinco municípios pernambucanos: Itapissuma, Olinda, Recife, Igarassu e Itamaracá. Cláudia Maoli, carioca que reside na Holanda há 20 anos, assina a direção do projeto. A diretora escolheu Pernambuco como ponto de partida do espetáculo. “Pretendemos levar a montagem também para Maceió”, disse Cláudia.

Essa é a segunda vez que Cláudia Maoli é responsável pela montagem no espetáculo, cujo texto também é uma parceria Brasil/Holanda, escrito pelos dramaturgos Carlos Lagoeiro e Bouke Oldenhof. A versão holandesa do espetáculo “Verhalen van Overzee”, uma criação do Teatro Munganga, de Amsterdam, estreou em janeiro de 2007, na Holanda.

Agora, a pareceria se confirma em uma nova leitura totalmente adaptada ao cotidiano nordestino. O figurino ganhou novas cores, inspirado no açúcar tão peculiar a nossa terra. As experiências e improvisos do elenco ficam por conta das histórias vividas pelos próprios atores. “ É muito interessante a experiência de montar o mesmo texto em dois países porque lá ninguém conhece Nassau”, explica.

A peça, direcionada ao público jovem, tem um cunho predominantemente pedagógico. A ideia é envolver esses jovens e levá-los a conhecer a história de um período que foi essencial para o desenvolvimento cultural de nosso Estado. “Várias escolas da rede pública estão vinculadas ao projeto. Tivemos o apoio da Fundarpe e Prefeitura, além de uma parceria com professores de várias matérias como artes, geografia, história, entre outras”, destacou Andrêzza Alves, que faz parte do elenco local.

Ao longo dessa viagem ao século 17, vários temas são abordados: imigração; o sentimento de “ser estrangeiro”; relação colonizador/colonizado; e o confronto de visões da vida e do mundo são algumas das reflexões levantadas. Por vezes, surgem diálogos imaginários, como na cena entre Maurício de Nassau e um líder indígena Tapuia. E no seu contato com uma mulher, já que Nassau não se casou, morreu solteiro e solitário aos 75 anos na Alemanha. “ Esses momentos são delírios meus, uma licença poética do que eu acho que foi, e não do que aconteceu exatamente. Queria que a peça não fosse meramente histórica, mas também tivesse contato com o lúdico”, diz a diretora.

A montagem conta ainda com alguns detalhes marcantes, como a trilha especial, composta por Sérgio Campelo do Sa Grama. No papel do conde Maurício de Nassau, o ator Júnior Aguiar, foge ao arquétipo típico do europeu padrão. A linguagem do metateatro também é explorada, e contribui para o entendimento do público acerca do “fazer teatral”, além de deixar à mostra todo processo de apropriação do personagem com cochias expostas. Propondo além de uma viagem no tempo, uma viagem pelo do teatro.

Programação:
Goiana -Hoje (9), às 16h e 20h, no Cine Teatro Polytheama
Itapissuma - sábado (12), às 16h e 18h, no Parque Ecológico
Olinda - Domingo (13), às 18h, de setembro, no Mercado da Ribeira
Recife - Dias 15 e 16 de setembro (só para convidados), às 19h, no Campo das Princesas
De 22 a 25, de 29 a 30 de setembro, e dias 01 e 02 de outubro (somente para escolas públicas), às 13h30 e 15h30;
Dias 26 e 27 de setembro (aberto ao público), às 15h, no Instituto Ricardo Brennand
Dias 03 e 04 de outubro, às 19h, no Forte do Brum
Igarassu - dia 20 de setembro e 06 de outubro, às 16 e 19h
Itamaracá - dia 09 de outubro, no Forte Orange, às 16 e 19h.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 09/09/2009