segunda-feira, 27 de abril de 2009

Chegou visita, e agora?

Pequenos detalhes mostram que não é difícil ser um bom anfitrião


Receber visitas e hóspedes em casa pode ser um hábito comum para muitas pessoas, mas nem sempre é tarefa fácil. Por mais que desejemos receber sempre bem nossos convidados, às vezes, ser um bom anfitrião envolve trabalho, empenho, tempo e, claro, espaço. Mas, calma. Isso não significa o fim das festinhas informais, nem da hospedaria amiga. Com um pouquinho de jogo de cintura e criatividade, seus convidados vão agradecer para sempre os bons momentos vividos na sua casa.

Improvisação e criatividade foi o que não faltou à dona de casa Maria Aparecida Belo. Tendo que dar conta de receber cinco hóspedes ao mesmo tempo, em meio a uma reforma, ela armou uma tenda de tecido em um dos quartos, que estava sem porta em função da reforma, para dar mais privacidade ao casal, que só a avisou da visita três dias antes de "aportar" em sua casa. " Ele precisou ficar aqui porque ia passar por um tratamento médico. Na mesma época minha filha e o namorado estavam chegando de Brasília", relembra ela, que ressalta: "Parei toda minha rotina só para poder receber todo mundo bem. É uma correria, mas depois que todos vão embora você sente um vazio".

Ter sempre muita gente em casa também é uma rotina para a executiva comercial Fernanda Cabral. Apesar de dividir seu apartamento com apenas uma amiga. Vira e mexe, Fernanda tem mais hóspedes. Prevenida, ela tem sempre estocado roupa de cama e de banho, escovas de dente novas, além de colchões. Dois. Um de solteiro e um de casal, que é inflável, ótima opção para não ocupar muito espaço. O prazer em receber é tão grande, que ela entrou para uma rede de relacionamentos na Internet voltada exclusivamente para viajantes que procuram hospedagem pelo mundo. O "Hospitallity Club" coloca o perfil de viajantes e anfitriões na rede para que eles se comuniquem e viajem sem gastar muito com hospedagem. "Esse ano recebi uma menina de Singapura. Gosto de receber, é uma filosofia nossa, de troca cultural mesmo", explica Fernanda, que tem em sua porta de entrada os girassóis de Van Gogh dando boas vindas aos que chegam. "Dizem que o amarelo na tela representa a amizade, durante muito tempo o próprio Van Gogh manteve esse quadro na casa dele", complementa.

Outra preocupação de Fernanda foi em relação ao espaço. O fato do antigo proprietário ter se desfeito de um quarto para aumentar o tamanho da sala, foi um dos aspectos decisivos na escolha de comprar o apartamento. A escolha dos móveis também foi toda pensada. "Eu optei por não colocar uma mesa na sala para ganhar espaço e poder fazer festinhas. Sempre que rola alguma coisa a gente improvisa dois banquinhos de madeira e uma almofada que servem de mesinha na varanda", disse Fernanda.

Na hora da Festa


Quantas vezes você já se pegou sem nada em casa e teve que se virar para receber aquela visita surpresa, que ainda trouxe mais convidados, e a reunião acabou virando uma festinha? Ser um bom anfitrião também implica estar preparado para esse tipo de situação. A consultora de Marketing e Eventos, Branca Góes, dá algumas dicas básicas para quem está sempre recebendo convidados em casa.

Quais tipos de móveis são imprescindíveis para quem recebe visitas frequentes?

Sofás e cadeiras confortáveis, mesinhas de apoio central ou lateral, aparador e um bom aparelho de som.

Que tipos de utensílios podem servir como peças coringa na hora de decorar a casa de forma funcional?
Um aparador pode virar um móvel funcional onde você coloca pratos, talheres e copos. Uma bonita tigela em aço inox pode servir para colocar gelo. Caso não tenha pinça para o gelo, uma colher antiga de prata de tamanho grande resolve o problema.

O que é importante ter sempre a mão?
Gelo, bebidas e comidinhas fáceis de servir.

Recorrer ao trabalho de profissionais seria uma solução?
Dependendo tamanho do encontro, é interessante contratar um buffet de pratos prontos que só precisem ir ao forno, por exemplo. Também acho fundamental o apoio de um garçom, além de deixar a dona da casa mais relaxada. o custo benefício compensa.


* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 26/04/2009

terça-feira, 21 de abril de 2009

Entrevista: Bandeira, Lacca, Aragão*

O novo cinema pernambucano, numa rodada de café

na foto, cortesia de Jedson Nobre, da esquerda para a direita: Bandeira, Lacca e Aragão


A partir de amanhã (21-abril-2009) Recife será palco do "Festival des 3 Continetes", que é realizado pela cidade francesa de Nantes, e tem os olhos voltados para os trabalhos cinematográficos da Ásia, África e América Latina. Dentro da programação itinerante do Festival, foi criado, desde 2000, o Ateliê "Produire au Sud" (PAS): Uma oficina de produção que tem como principal objetivo discutir, analisar e apresentar as ferramentas técnicas necessárias para a realização de filmes, cuja aspiração é uma carreira de âmbito internacional. A ideia é selecionar projetos para receberem a consultoria de uma equipe internacional de especialistas em roteiro, produção, vendas e pitching.

Pela segunda vez o PAS acontecerá em Recife (a primeira foi em 2006). Entre os oito projetos selecionados para partircipar do Ateliê, dentro do universo de 40 inscritos, foram escolhidos três longas pernambucanos. (dois do RJ, dois de SP e um do CE). A escolha da curadoria realizada em Nantes reflete o talento de uma nova geração de cineastas que, a excessão de Daniel Bandeira, fará seu debut em longas-metragens. Reunimos os cineastas Daniel Aragão, Bandeira e Leonardo Lacca, no café Castigliani, na Fundação Joaquim Nabuco, para um bate papo descontraído sobre seus projetos selecionados, "Boa Sorte, Meu Amor", "Propriedade Privada" e "Décimo segundo", respectivamente, sobre cinema, produção e mercado internacional. Os Produtores Pedro Severien (PS) e Sarah Hazin também participaram da conversa que rendeu muitas ideias e risadas.

Dentro dos projetos selecionados pela comissão do Produire au Sud, em Nantes, o que vocês identificam de peculiar no projeto de vocês, que acreditam que tenha chamado a atenção da curadoria, existe algo em comum entre eles?

Lacca Isso é interessante porque eu conheço o trabalho de Bandeira, de Aragão nem tanto, mas eu acho que nenhum dos três tem um apelo regional pernambucano. Carregam Pernambuco, mas não são nada característicos da regionalidade. Ao mesmo tempo tem porque são todos filmes daqui.

Bandeira Eu acho que é mais uma questão de esfera, porque a gente de Pernambuco considera o regionalismo como uma coisa do interior de Pernambuco. Mas agora que a gente está numa esfera mais global, o que é brasileiro, e que é típico do terceiro mundo, é que é a medida do regional pra eles. Então embora a gente não se considere regional porque não está tratando das coisas de Pernambuco, também temos que ficar atento a um certo carimbo de filmes de terceiro mundo. Isso eu percebo muito pelo menos na minha história, que tem essa coisa de conflitos de classe. Eu te contei (pergunta a Lacca), tu sabe qual é a história? Tu também Pedro?... É a historia da mulher num carro blindado

Lacca É o teu tem essa coisa da parte urbana que vai para um conflito com a parte rural. Eu não conheço bem, mas o que eu entendi...

Bandeira É o que ta muito forte, pelo menos na minha história é essa representação do discurso clássico do conflito entre classes. Então muito embora aparentemente seja a história dessa mulher no carro de classe alta, que vai pro interior e fica presa nesse ambiente rural que não é o ambiente dela. Ai dentro você tem esse discurso de classe que é muito presente na agenda dos países de terceiro mundo.

Aragão A minha relação é tipo, o jogo da classe mais alta já ta ganho, entendeu? Ai o problema chega a ser deles com eles mesmos. Já existe uma disputa por igual, eu não estou do lado nem de um nem do outro. Os fatos já indicam que a vitória está dentro dessa classe rica e como ela lida com ela mesma. E é curioso porque eu também estava falando com o Pedro que também trata de isolamento, porque a gente está buscando um pouco de trazer a identidade de um cinema sobre essa classe mais rica daqui, mas um filme só não vai conseguir fazer isso. Eu acho que isso é muito particular. A gente vive aqui e a gente sabe que existem suas particularidades, mas a gente não sabe como vai traduzir isso cinematograficamente. Não é um filme só que vai fazer isso. Tem que ser diversos filmes. Talvez nesse (Boa sorte. Meu amor) eu tenha mirado fazer o primeiro trabalho sobre esse universo. Você também tem isso, só que talvez num momento mais extremo deles, não é? (pergunta a Bandeira)

Bandeira É, pois é. Mas é porque eu também não tenho um discurso muito didático não. Eu pretendo fazer de uma maneira que quem quiser vai ver um filme de suspense e quem quiser pode também desenvolver uma tese social. Eu realmente não apontar um caminho não. Agora eu queria saber de Leo, porque a gente ta falando de todo um discurso de classes, mas não cabe..

Aragão É, o teu é o mais "gayzinho", né? É o mais do coração. (risos)

Lacca Talvez o meu seja o que tem mais uma sutileza nesse sentido de não deixar tão exposto essa questão social de classes. Eu acho que tem também, até porque o curta é um fragmento do roteiro, que mostra a relação entre o casal. No longa aparecem a relação com a cidade, com outros personagens... Enfim tem uma questão de "focularização" de Pernambuco por parte do pessoal do sul, tem isso também no filme, ta lá. Mas é um filme que eu não parti disso. É uma historia que se eu for interpretar eu começo a enxergar esse tipo de coisa, mas só depois. Também eu não quero estar com nenhum discurso feito, é uma história que eu tenho a contar. Mas esse elemento vai estar lá presente.

No caso de vocês dois (Daniel Aragão e Leo Lacca) Aragão teve o curta "Uma vida e outra" que foi um tipo de fragmento do roteiro original que é de 2003...

Aragão Porque na verdade a minha idéia, quando eu vi que não ia fazer o longa nem tão cedo, foi que eu comecei a pegar esses personagens e desenvolver outras histórias. Não tem nada a ver com os personagens do longa. Mas tem a ver porque é a mesma idade, mesma classe, situações parecidas. Sendo que o longa vai por outro caminho. É outro conceito. Tanto que no novo curta que eu vou lançar agora (Não me deixe em casa), talvez tenha mais relação. Nesse outro eu não tenho um personagem só, eu já quis expandir essa vontade de fazer um longa criando mais personagens. Porque eu gosto do cinema narrativo clássico e pronto. Eu gosto de filme com narrativa hollywoodiana dos anos setenta, com pai, mãe, todos os personagens que eu puder botar. Claro que de acordo com as necessidades do filme.

Certo. Mas no caso de Lacca, parece que aconteceu o inverso. Como você estava falando, em Décimo Segundo primeiro houve o formato em curta, e agora você expandiu a perspectiva do filme, é isso?

Lacca Na verdade eu até tenho medo por estar usando o mesmo título, porque as pessoas começam a achar que é um curta esticado. Mas na verdade, o curta foi algo que não deveria ter acontecido, foi um pouco precipitado ter feito o curta. É como se eu tivesse pegado um fragmento do longa e feito o curta. O processo dele foi caminhando e quando eu tava filmando o curta eu já tinha parte do roteiro do longa sendo desenvolvido. E ao mesmo tempo isso é um ponto positivo, no sentido em que eu pude fazer o filme quase como um laboratório de personagens. Tanto é que no curta os próprios personagens, os atores na preparação, eles já tiveram uma coisa do longa na caracterização e na expansão desse universo. Então o longa na verdade é isso, a expansão do universo, e o curta é apenas um fragmento.

Em relação ao Cinema Pernambucano vocês falaram da questão do regionalismo, mas podíamos dissociar o rótulo de "Cinema Pernambucano" tido como um pacote único, quando na verdade não existe uma unidade, cada projeto tem suas peculiaridades. Podemos cair no erro de dizer que os três foram selecionados pelo PAS por serem parte desse pacote. Essa diferenciação vocês percebem na escolha dos roteiros, o diferencial seria porque vocês estão fazendo um cinema que acima de tudo é universal? Daí o interesse de fazer com que vocês participem de uma oficina que vai fazer com que o processo de produção se torne mais internacional?

Severien Eu tenho um comentário em relação a isso. É talvez uma característica desse cinema pernambucano que não é uma escola, porque os filmes não têm necessariamente ligação estética ou mesmo de conteúdo, são bastante diversos. Mas eu acho que aqui, há algum tempo já, vem acontecendo algo que é meio mágico que é um grupo de pessoas que se mantém muito integras na forma e na proposta de produção do tipo de filme. Se você pensar que aqui tem vários cineastas, no sentido mais amplo, produtores, diretores, editores... que acreditam no cinema de autor. Isso não quer dizer que esse cinema seja menor ou mais fechado...

Hazin Ou mais sofrido, né?

Severien Pois é, nada disso. Vários filmes dessa nova turma têm o desejo cada vez maior de se comunicar, de ter um diálogo com o público. Não existe o interesse de se manter no nincho fechado. Mas quando o cara se mantém conectado com a proposta artística que todos os filmes têm, isso é o que eu acho que chama a atenção de uma comissão que vai lá ler os projetos. E não necessariamente questões de regionalismos, ou manifestações folclóricas, ou exotismos... Muitos dos filmes que estamos discutindo são totalmente contemporâneos, com todo o misto de aspectos que se envolvem. São relações muito contemporâneas, mesmo quando tratam temas antigos, se colocam de forma moderna.

Bandeira Acho que existe esse interesse da gente se comunicar com o público até no sentido técnico. Pelo menos da minha geração, Leo, Daniel... Tem uma galera que começou a fazer filme meio que na marra, fazendo em casa. Cada qual somos roteirista, diretores dos próprios filmes, mas a gente também sabe pegar a câmera e filmar. A gente vai absolvendo diversas funções para desempenhar o trabalho da gente. Daí nessa preocupação muito atual da gente se comunicar com as pessoas, acabamos incorporando também um pouco essa função de distribuidor e produtor do próprio filme. É muito sintomático que o PAS chame para o workshop o produtor, mas também o diretor. O diretor supostamente não deveria estar preocupado com isso, mas faz parte dessa lógica de produção o diretor incorporar o trabalho dele já pensando como vender o resultado, quando, e se o filme ficar pronto.

Hazin Inclusive, não necessariamente seria o diretor, poderia ser só o roteirista e o produtor. Porque nem sempre o diretor também é o roteirista. Essa é uma lógica que funciona bem principalmente para a gente.

Bandeira Pois é, ai vem o questionamento... O que é exatamente que o PAS detecta daquilo que a gente faz? O que é que ele espera da gente e o que é que ele espera trazer para a gente? A mim interessa pessoalmente saber que público é esse que eu estou querendo atingir onde quer que seja. E, a partir daí, eu gostaria de manter minha autonomia de conhecer esse público e dizer que aqui eu abro concessões, e aqui eu não abro concessões.

Aragão Talvez a seleção deles se deva também muito ao conjunto do nosso trabalho.

Vocês não escreveram só esses projetos que foram selecionados, vocês mandaram mais coisas, é isso?

Hazin Na verdade cada um enviava uma cópia do seu último projeto. E o argumento do novo.

Lacca Na verdade tinha que ser porque não foi nem um roteiro completo, foi só um argumento puramente narrativo. O DVD ta presente lá sua linguagem cinematográfica.

Aragão Eu acho que o curta que a gente mandou junto com o projeto ajudou pra C... Porque é muito poético dizer que foi por causa do blá, blá, blá da justificativa. (risos)

Bandeira Na verdade eu vim acompanhando algumas críticas na internet sobre o interesse específico do Festival 3 Continentes (Ásia, África e América do Sul) em filmes de países ditos em desenvolvimento. Independente do local onde será ministrado, eu escutava essa critica que é um festival Europeu que teria interesse num tipo de "freak show" do terceiro mundo. Tem muita daquela expectativa sobre o que exatamente o festival quer ver desses países. Eu realmente não sei, a julgar pelas seleções do Festival, as itinerantes, os filmes que já foram apoiados e tal, eu acredito que de fato exista um interesse nesse sentido de captar a diversidade da produção e das vivências, mas não saberia dizer até que ponto existe esse fascínio mórbido.

Aragão Na verdade esse projeto passou por uma fase que pra mim foi um laboratório. Eu pensei assim, eu vou escrever um roteiro que não importa se eu só vou fazer ele daqui a dez anos, vai ser meu laboratório, meu estudo. Serviu até para que eu aprendesse a escrever os roteiros dos curtas que eu escrevi posteriormente. Por mais bizarro que seja essa opção. Por isso o roteiro passou por tantas versões. Até quando Pedro entrou no projeto. Quando foi Pedro?

Pedro 2007.

Aragão Pronto. Quando Pedro entrou no projeto, já foi no momento de fazer com que agora ele se torne realidade e entrar no PAS é como se tivesse sido o primeiro passo no sentido de colocar a prova. Eu estou esperando ouvir alguma coisa dos especialistas. Quero que eles cheguem para dizer... Olha o seu roteiro ta uma m... Sei lá... Algo do tipo.

Vocês querem ter um feedback do que vocês estavam fazendo?

Aragão Pois é, durante o processo eu tive vários feedbacks que estavam fragmentados até pelo trabalho nos curtas. Tipo saber que uma funcionou, e que o longa também vai ter. E até dos amigos e das pessoas que estão envolvidas.

Então essa etapa seria mais de profissionalização do processo. De ter o crivo dos "experts" dizendo o que é que vocês estão acertando, o que estão errando, o que vocês precisam fazer para melhorar a carreira dos filmes lá fora. Basicamente é esse suporte?

Aragão Pois é, até porque uma vez eu estava em um Festival e um cara de Sundance chegou pra mim e falou, "Só converso com você quando você tiver um longa". Se nem com longa os caras conseguem ganhar dinheiro. Com curta não dá. Você está num processo diferente (falando com Bandeira), esse teu projeto agora pode ser o primeiro projeto com potencial internacional, mas você já tem um longa na bagagem. Você vai pelo menos poder negociar com os produtores internacionais. Traduzindo, não adianta você ir para um Festival Internacional sem ter pelo menos um longa escrito.

Bandeira É na verdade, é aquilo que a gente já vivia como realizador de vídeo digital, já havia esse preconceito. Você é meio que café-com-leite.

Aragão Eu respeito muito Fernando Spencer, Edgar Navarro... Que passaram muito tempo fazendo curta, mas assim, comercialmente é o inverso. Curta é menos, infelizmente. Você ter 150 mil para fazer um curta, tudo bem, no fim das contas a gente sabe que é o que tem que ser. Mas o trabalho que dá e o processo.

Lacca É interessante porque entre a gente aqui, eu pensei agora que nunca ganhamos dinheiro para produzir curta, sempre só para finalizar. (risos) Essa questão de orçamento é outra coisa que eu fico me questionando, porque muitos orçamentos aqui de longas, e de curtas, se baseiam em publicidade e na verdade a gente tem que se basear em outra coisa, é outra proposta, mas também não é fazer sem dinheiro. É fazer com todo mundo ganhando, mas de forma consciente. Você vê projetos de curtas com 300 mil, que é um orçamento quase possível de fazer um longa dependendo do projeto.

Bandeira Pois é, mas é que se existe uma lógica - a lógica do terceiro mundo - eu acho que é exatamente essa. Existem projetos para curtas mesmo, e cada projeto tem seu respectivo orçamento pra ser feito da maneira correta, gerando empregos, com estimativa de público e etc.. Tem filmes que são pensados pra ser feitos com R$200,00, tem filmes que são pensados para serem feitos com R$ 300 mil, isso é legítimo. Acontece que a gente vive dentro de um sistema onde quem pega R$300 mil tem que pensar imediatamente em que é esse dinheiro, que vai para cultura, não foi gasto. É como se esse patrocínio dado pelo Estado para cultura, fosse tido como um saque dos artistas, mas isso é porque a gente vive o tempo inteiro com a falta de dinheiro para fazer as coisas. Então num país como esse, ou você usa o dinheiro do Estado, ou o dinheiro de um produtor privado que vai colocar a grana dele e vai correr o risco. A questão do risco é que a gente não está acostumado a lhe dar.

Hazin Não tem um mercado. A gente literalmente não tem um mercado, a gente tem um patrocinador único que é um “papai” que dá o dinheiro para você fazer um filme sem se preocupar com nada, com lucro garantido tanto para sua empresa, como todos os salários pagos. E depois já era não existe a preocupação de criar esse mercado.

Bandeira Pois é, independente desses fatores, o fato é um só. Por conta disso tudo, se faz cinema realmente de um jeito diferente. Temos uma narrativa diferente, uma estética diferente, tudo sempre acompanhando essa questão do dinheiro e de como vai ser usado. Por exemplo: a gente filma "Amigos de Risco" usando uma câmera SD, que na época já era muito corrente, mas não era tida como profissional para fazer um filme para cinema. Outro exemplo, que é uma questão pessoal minha, eu não filmo histórias que tenham chuva. Por quê? Porque eu penso numa produção de um carro de bombeiro fazendo uma chuva artificial, molhando toda cidade, desperdiçando, pra fazer uma cena do meu filme. O fato é que isso altera a forma como eu penso as minhas histórias.

Severien Uma coisa que é importante é que quando o processo criativo é dissociado da produção, pode se tornar algo simplesmente do mundo da fantasia. Se você começa a pensar no filme, sem pensar em como você vai realizar aquilo, você ta se assassinando como realizador. No sistema que a gente vive, e que é muito recente, porque há menos de 20 anos atrás estava sendo lançado o primeiro longa-metragem depois de uma lacuna de três décadas. Muito do que está acontecendo agora é fruto de um processo de aceleração de produção de muita gente. Há muito pouco tempo atrás a gente tava no nada, tava no zero, e em 15 anos muita gente começou a trabalhar pensar, e levar em conta essas questões para poder hoje a gente ter um cinema, uma produção.

Hazin E tentando se equiparar a um mercado internacional que não teve essa lacuna, que hora nenhuma parou. E hoje a gente ta correndo conta o tempo para tirar o atraso.

Lacca É na verdade, eu acho que a maior lacuna que você falou é com relação ao mercado principalmente. Porque em relação à realização, a gente já tem uma boa base de curta, sem falar em película. Longa é que ainda é difícil porque, por exemplo, nessa premiação de ontem (Abracine) ainda negligenciam cineasta como Tonacci, Julio Bressani, e tantos outros... Apesar de que o filme que ganhou foi um filme que realmente teve muito público, né?

É, inclusive, eu ia pedir para vocês comentarem os prêmios de "KFZ-1348" e "Estômago", que foram dois filmes que passaram pelo PAS na edição de 2006. Como vocês lidam com essa questão de premiação. É um retorno do trabalho, vocês fazem cinema para isso?

Lacca Não, não. Eu acho que todos concordam que premiação é uma coisa que está quase como previsão do tempo. (risos) Não é uma coisa que você vai se basear também. Mas o que eu falo não é nem necessariamente relativo às premiações em si, mas o que eu falo também é em relação às indicações. Para mim nenhum ali é uma referência minha de cineasta brasileiro. O cinema brasileiro ainda fica naquele impasse de achar que o filme que dá público é aquele filme engraçado. O problema não é a narrativa do filme, é uma questão muito maior e estrutural. Por exemplo, Carlão, com o "Filme Demência", deu muito mais público do que "Estômago".

Aragão É, anos 70.

Lacca É outra coisa, é outro momento. Agora a gente não pode entrar nessa de abrir mão e começar a fazer "Se eu Fosse Você" para estar dentro.

Bandeira É porque também a gente costuma falar de público sempre no singular. Mas na verdade existem uma série de públicos que não vão para o cinema. Existe um público hegemônico que tem a grana para freqüentar e usualmente o gosto desse público é tido como referência. Mas não é bem assim, não é que você faz um filme para ninguém. Sempre existe alguém para vera aquele teu filme. Só que esse público dificilmente vai ao cinema, dificilmente se encontra e troca idéias.

Aragão Eu acho que o pior filme lançado em Holywood dá mais público do que "Se eu fosse você".

Para encerrar, qual a expectativa que vocês têm em relação a esse quatro dias de oficinas. Como cineastas, diretores, produtores, o que vocês acreditam que pode mudar no trabalho de vocês?

Lacca No meu caso, eu estou muito interessado na parte de roteiro...

Aragão É, eu também.

Lacca Eu acho que é a que mais pode me ajudar a entender e enxergar o meu projeto. Porque questões relacionadas ao pitching, eu acho que tem mais a ver com produção. Mas como Daniel mesmo falou que o diretor participa desse processo, eu também me interesso. Só que o que de verdade eu estou muito empolgado é a questão de roteiro.

Aragão O que for melhor para gente aqui para que a gente se aproxime mais do mercado internacional é proveitoso. Porque o mercado tem interesse em contratar diretor de terceiro mundo; São os caras que fazem filmes mais baratos, são mais sensíveis; mais criativos e menos mimados. Sabem dar valor a dinheiro. (risos). Para mim Rio de Janeiro e São Paulo é outro país, cinema de lá para mim é M... Eu não vi nenhum filme de lá que eu gostei esse ano. Acho que só Eduardo Coutinho (Jogo de Cena). Os filmes que a gente faz aqui é outra coisa, existe uma divisão mesmo, é outra história tudo diferente.

Lacca Inclusive quando se tenta trazer esse mote de lá pra cá, eu acho que é um desastre

Hazin Cinema de Guerrilha, não é Daniel?

Aragão A questão não é nem essa. Isso já era. A discussão já é outra, não é a questão de fazer com muito, ou pouco dinheiro. Se a gente tiver muita grana para fazer o longa a gente vai continuar fazendo diferente.

Bandeira Eu acho que é consenso aqui que o PAS é uma ferramenta importante, mas ela não é vital, não é uma tábua de salvação. Eu acho que a relação da gente com o Produire é exatamente um ponto de comunicação, de contato com um outro mercado. É uma nova etapa que a gente está querendo atingir. Mas a lógica continua exatamente a mesma de quando a gente começou. Sem a gente se conhecer, sem a gente se falar, e sem a gente trocar idéia entre a gente, ninguém tinha saído do canto. Então com o PAS nós estamos reproduzindo essa tática. Não é uma novidade para a gente, na verdade é só a instância que está um pouco mais ampla.

Severien Eu acho que tem uma parte das informações de como esse jogo é jogado no nível internacional, que não está na internet, não ta em livro, não ta em lugar nenhum... ta dentro das pessoas que participam desse jogo. Isso é uma coisa que me cria expectativa em relação ao PAS como produtor, que eu acho que é importante esse tipo de diálogo, de conversa que não é publicada, digamos assim. (risos)


* A entrevista foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 20/04/2009 e pelo site cinemaescrito.com

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Denise Fraga mostra a sua "Alma Boa"

A difícil tarefa de se manter bom em um mundo cheio de maldade é o fio condutor do espetáculo "A Alma Boa de Setsuan", protagonizado por Denise Fraga, que chega hoje ao Recife para uma temporada de três apresentações no Santa Isabel. O texto, escrito há quase 70 anos pelo dramaturgo alemão Bertold Brecht, explora a dualidade do ser humano que tem sempre em si próprio uma parcela boa e má.

O enredo fascina por continuar sendo atual e por tratar questões densas da condição humana de forma leve e bem humorada. Mérito também atribuído à direção de Marco Antônio Braz, que recebeu o Prêmio Shell de melhor diretor. Em entrevista concedida à Folha a atriz falou do seu envolvimento com o teatro, projetos e sobre a ansiedade da estreia em Recife.

Como foi que conheceu o texto de Brecht? É a primeira montagem de um texto dele?

Eu só tinha feito um texto dele quando ainda estava na escola. Na verdade, a motivação para fazer a peça veio da minha vontade de trabalhar com o Braz (diretor). Ele é criativo e irreverente, tem um grupo em SP (círculo de Comediantes) que faz um teatro lúdico, que rompe com as leis convencionais e eu sempre gostei muito disso. Via eles em cena e tinha muita saudade do meu grupo, queria fazer algo com um elenco grande. Então começamos a ler várias coisas, para escolher o que teria a nossa cara. Quando li o texto de Brecht soube na hora. Com "A alma" achei a peça da minha vida" . O texto leva a uma reflexão filósofica que as pessoas tem de serem boas ou más. Fala dos porquês de respondermos melhor a dureza. Questiona se essa dureza é mesmo essencial ao ser humano. Brecht consegue falar de tudo isso, que são coisas pesadas, de uma forma leve e bem humorada. A montagem de Braz tem muito disso também, vamos desvendando o fazer teatral, vamos na porta receber as pessoas, nos envolvemos com o processo de cenário e de contraregragem. Brecht tinha muito disso, a coisa do artista de cabaré, ele costumava dizer que não há discurso sem divertimento, e eu concordo absolutamente.

Eu sou daquelas que acredita que humor pode mandar o mundo. Só ri aquele que compreende a essência, o humor passa pela reflexão. Nunca tive tanta propriedade de falar um texto como tenho com esse.

Como é estar em cena com dois personagens distintos? já viveu isso no teatro?

Essa é a grade questão da peça. Na verdade, não são dois personagens, é a Chen Te travestida de Chui ta. Ela não é uma atriz, ela compõe esse estilo como uma capa, uma forma de proteção. Esse é o grande lance da coisa, travestir-se em outro, fazer um personagem que está em outro. É a transparência da coisa, Chen Te aparece em Chui ta, e por sua vez, a Denise aparece em Chen Te. Isso por si só já é muito teatral. É só usar um chapéu e um paletó que sou o primo, é fazer parecer o que não é. Esse é o papel mais difícil da minha vida.

Como foi o processo de montagem?

Levei seis anos para montar essa peça, foi uma enorme empreitada. Só conseguimos graças ao patrocínio do Bradesco Prime, que depois de uma temporada super bem sucedida de 8 meses em SP, decidiu patrocinar a nossa turnê que é muito cara porque a equipe é muito grande, o elenco é imenso para os padrões atuais. Viajar com um espetáculo desses para o Nordeste é quase como ir para outro país. Pensei várias vezes em desistir, mas sempre que falava com Vilaça (marido) e liamos o texto tinha mais certeza que eu precisava montar a peça.

Como é essa relação com o teatro?

Não estou longe a muito tempo, nunca fico. A última peça foi Ricardo III, há dois anos. Acho que o teatro é a essência do ator. Estar em temporada repetir a mesma coisa várias vezes como se fosse a primeira vez, é o "adubo" do nosso trabalho. Porque você quer melhorar, mas sabe que nunca vai atingir a perfeição. É o exercício da prática, a musculação do ator, é onde você melhora. Na televisão você resolve. No teatro você pesquisa. O teatro é pesquisa em si, é como um jogo de equilibrar pratos, sempre que você dá um jeito em um, já tem outro prestes a parar.

Quais são os projetos que estão na agulha?

O filme o contador de história chega aos cinemas em agosto. Foi uma experiência muito boa. A protagonista é a atriz portuguesa Maria de Medeiros, que fez Pulp Fiction e já atuou em algumas novelas de Manoel Carlos. Fora isso estamos com o projeto de um progra humorítico para entrar na grade da programação da Globo no segundo semestre, continuando a parceria com José Roberto Torero, Maurício Arruda e Luiz Vilaça.

Qual a relação com o público Recifense?

É a primeira vez que venho com uma peça para o Nordeste. Estou muito ansiosa para descobrir como será. Todos me falam que o teatro (Santa Isabel é lindo), estou louca para conhecer.

terça-feira, 14 de abril de 2009

Superação através do palco

Pessoas comuns encontram no teatro uma forma para vencer a timidez

Característica, charme, cautela... A timidez pode ser vista de várias maneiras diferentes e, muitas vezes, pode ser mal interpretada dentro de certos contextos sociais. Quando existe em excesso, este traço pode deixar de ser parte da personalidade e passar a ser um problema na vida de uma pessoa. Branco de memória, medo de falar em público e até mesmo o bloqueio total de conversas com desconhecidos podem ser alguns dos efeitos resultados da vergonha excessiva. De acordo com a psicóloga Marta Hazin, a timidez passa a ser patologia quando impede o indivíduo de se relacionar socialmente. “ Quando isso atrapalha a vida pessoal e profissional da pessoa, é necessário um acompanhamento médico para que ela consiga romper esse bloqueio”, explica.

É nesse momento que a magia do teatro entra ação. As aulas de Artes Cênicas são um reduto bastante frequentado pelo tímidos de plantão. O curso de interpretação é um recurso indicado por terapeutas para pessoas com perfil de timidez patológica. “Usamos esse artifício para estimulá-los a vencer a vergonha usando a arte como forma de se expressar”, diz Marta.

Com um tom de voz baixo e ainda extremamente reservado o estudante, Marcos Aurélio, de 20 anos, é um exemplo de como o teatro tem o poder de ajudar a vencer o bloqueio da timidez. Frequentando aulas de interpretação há 3 anos, o jovem conta que já foi muito mais tímido do que ainda é. “Tinha medo de falar em público e de conversar com as pessoas. Mal saía do quarto, sempre fui uma criança tímida”, conta Marcos, ainda de braços cruzados e cabeça baixa. Depois de cinco anos de terapia, o curso ajudou-o a se abrir mais e melhorar seu relacionamento com as pessoas. Hoje ele já vivenciou a experiência de se apresentar em três espetáculos e até já se aventurou fazendo um teste para o elenco de um curta-metragem. “Sonho em fazer o curso de jornalismo e continuar no teatro amador. O teatro foi fundamental para mim”.

O ator e professor de teatro, Williams Sant’Anna, já viu muitos casos como o de Marcos. Ao longo de quase 20 anos de curso, já passaram por suas aulas médicos, engenheiros, professores e advogados. Todos com o interesse comum de usar a dramaturgia como forma de vencer o excesso de timidez. “ Mais de 60% das turmas são de profissionais das mais diferentes áreas que vêem no teatro benefícios para vida pessoal”, diz o professor, que dá aulas no projeto “Mergulho Teatral” do Espaço Cultural Inácia Raposo Meira. “Mas é importante respeitar o tempo de cada um, as limitações que eles tem, e aos poucos vamos conseguindo resultados”, completa.

Nem sempre a timidez atinge níveis que precise receber um diagnóstico clínico, o que não quer dizer que mesmo em escala menor, o problema não atrapalhe a vida de quem é assim. A assessora parlamentar, Nazaré de Lemos, é considerada uma pessoa extrovertida entre colegas de trabalho e amigos, mas basta que ela precise fazer uma apresentação em público para ser travada pela timidez. “Não conseguia ser o foco das atenções, hoje consigo usar as técnicas de interpretação no meu dia a dia. Até consegui fazer uma pós-gradução e apresentar trabalhos na sala de aula”, conta Nazaré que foi convidada para fazer uma figuração especial na Paixão de Cristo do Recife. Para Socorro Raposo, proprietária do Espaço Cultural, o teatro tem o poder de transformar vidas além de não ter contra-indicação. “Trabalhamos com crianças, jovens e adultos, não existe limite de idade. O único perigo é ser contaminado pelo vírus do teatro e não querer deixar os palcos nunca mais”, brinca Socorro.

Serviço
Espaço Cultural Inácia Raposo Meira
Mergulho Teatral
Informações: 3421-3503

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 12/04/2009

quarta-feira, 8 de abril de 2009

A arte de transformar vidas*

Grupo Corpos e Tambores trabalha com crianças e adolescentes que já estiveram em situação de risco social


AMANDA SENA


Marcelo Lacerda

Não é de hoje que arte é usada como instrumento transformador de vidas. Histórias de sucesso e crescimento pessoal a partir do acesso à cultura já foram contadas inúmeras vezes, mas algumas merecem ser contadas por serem, acima de tudo, exemplos de vida que inspiram outras vidas.

Histórias como a de Maria Neves, ex-aluna e professora de dança do Movimento Pró-Criança desde 2003. Maria chegou à Fundação aos 12 anos, quando ainda morava na Comunidade do Caranguejo, em Olinda, e recebeu a visita dos educadores que na época, ainda não tinham sede própria e costumavam fazer seu trabalho visitando as comunidades. Nesse momento, Maria teve seu primeiro contato com o universo da dança, pelo qual se apaixonou e posteriormente o transformou em trabalho.

Depois de sete anos fazendo parte da Cia de Música e Dança do Movimento, um convite inesperado ajudou a estreitar ainda mais os laços de Maria com a dança. Ela recebeu uma bolsa de um ano para estudar balé clássico, dança contemporânea e jazz na escola Alvin Ailey, em Nova York. A instituição é famosa por ter formado algumas personalidades famosas, entre elas a diva pop Madonna. “Foi uma experiência única e tudo serve como bagagem para o nosso trabalho. Apesar de aqui dar aulas de dança popular, toda experiência conta, tudo é válido”, disse Maria, que recebeu o convite para compor a equipe de educadores do Movimento assim que retornou ao País.

Em seu trabalho como coreógrafa do grupo Corpos e Tambores, trabalha com crianças e adolescentes que, assim como ela, estiveram em situação de risco social, mas encontraram na arte motivos de sobra para reverter essa situação. “Até hoje eu me sinto muito feliz, trabalhar aqui é uma forma de retribuição tudo aquilo que o Pró-Criança fez por mim. E que ainda continua fazendo, porque o aprendizado é recíproco”, afia Maria.

O tempo que esses jovens dedicam as aulas e ensaios é um tempo proveitoso e produtivo, é a oportunidade que eles têm de ter acesso à cultura, que por ventura eles não teriam. As aulas acontecem sempre no horário diferente da escola, e para participar das atividades é pré-requisito fundamental conciliar os ensaios com o rendimento escolar.

É o caso de Niedson Oliveira, de 19 anos, que passou uma temporada na instituição, saiu, mas acabou voltando e agora faz parte do grupo de dança. “Estar aqui é uma coisa ótima, descobrimos nossos talentos. E Maria é uma professora maravilhosa, é a nossa mãe. Ela nos ensinou tudo sobre dança, sobre ética...tudo que sabemos”, falou Niedson.

O grupo Corpos e Tambores está em cartaz com a temporada de apresentações do espetáculo “Um passeio pelos ritmos pernambucanos”, que também conta com a participação dos alunos da oficina de música e percussão, ministrada pelo professor Edilson José da Silva. O grupo se apresenta no próximo dia 16, no teatro do Parque, e dias 18 e 19 no teatro Maurício de Nassau.

Celeiro de Sucessos


Com quase 16 anos de história, o Movimento Pró-criança tem formado, ao longo da sua jornada de trabalhos junto às comunidades, vários jovens talentosos que se destacam nas mais diversas áreas. Tanto que, a fundação está preparando um livro que vai contar as “Histórias de Sucesso” que já passaram por lá. São atores, bailarinos, fotógrafos que conseguiram se reinserir na sociedade e se destacar no universo das artes e também dos esportes. “O que é mais gratificante é que todos eles, assim como Maria, não querem sair, têm vontade de ficar aqui até como professores. Mas também temos o cuidado de formá-los para o mundo”, explicou a gestora da unidade Piedade, Adriana Paiva.

Serviço

Um Passeio Pelos Ritmos Pernambucanos
Teatro do Parque
Rua do Hospício, 81, Boa Vista
Dia: 16 de abril às 18h30

Teatro Maurício de Nassau
Vigário Tenório, 135, Bairro do Recife
Dias: 18 e 19, às 18h
Ingressos: R$5,00 (inteira) e R$2,00 (meia)

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 08/04/2009

segunda-feira, 6 de abril de 2009

A moda é ga­rim­par

Buscar peças em bre­chós é uma al­ter­na­ti­va prá­ti­ca e eco­nô­mi­ca para ga­ran­tir um vi­sual único

AMANDA SENA

Marcelo Lacerda
Nos úl­ti­mos anos, vem se con­fir­man­do no Recife uma ten­dên­cia já comum nas gran­des me­tró­po­les: a moda dos bre­chós. Os lo­cais con­fe­rem um ar de nos­tal­gia e fas­ci­nam não só pelo preço (a maio­ria das vezes mais ba­ra­to do que o das lojas), mas tam­bém pela grata sen­sa­ção de en­con­trar uma peça única, de­pois de horas de ga­rim­po. As peças de se­gun­da-mão vêm en­vol­vi­das de his­tó­rias e sig­nos de uma moda que pode ser rein­ven­ta­da e adap­ta­da ao novos tem­pos.

O Brechó Tutti-Frutti tem um toque “retrô” em todas as rou­pas e aces­só­rios. Funcionando em um ca­sa­rão an­ti­go, há três anos, o es­pa­ço, que tem uma at­mos­fe­ra toda es­pe­cial, é ad­mi­nis­tra­do pelas ir­mãs Cláudia Holanda e Cris Mergu­lhão. Ambas se en­vol­vem di­re­ta­men­te no pro­ces­so de se­le­ção das peças e ten­tam sem­pre en­con­trar no­vi­da­des. “Queremos rou­pas com per­so­na­li­da­de e es­ti­lo. Sempre que viajo ao Rio, ou São Paulo, pro­cu­ro coi­sas novas. Lá é bem mais fácil achar ar­ti­gos di­fe­ren­tes e de qua­li­da­de”, disse Cláudia, que tam­bém é ar­tis­ta plás­ti­ca. Cláudia res­sal­ta que às vezes um pe­que­no toque já faz toda a di­fe­ren­ça. “Uma bolsa, um cha­péu ou um bro­che fazem toda di­fe­ren­ça”. Para os mais de­sa­vi­sa­dos, as rou­pas podem até pa­re­cer um tanto quan­to exa­ge­ra­das ou fora de moda, por isso, ela lem­bra: “A pes­soa que vem a um bre­­chó não pode ter a ca­be­ça muito fe­cha­da. Tem que ter ati­tu­de”.

Para a fi­gu­ri­nis­ta Andreia Montei­ro, a vi­si­ta ao bre­chó sig­ni­fi­ca mais do que pro­cu­rar peças des­co­la­das. Trabalhando com ci­ne­ma e TV, ela, que foi fi­gu­ri­nis­ta dos fil­mes “Ama­relo Manga” e “O céu de Suely”, cos­tu­ma fuçar mui­tos bre­chós e ba­za­res em busca de novas re­fe­rên­cias. “ Acho legal en­con­trar lu­ga­res que ofe­re­cem um di­fe­ren­cial”, co­men­tou Andreia, que além de pro­cu­rar ma­te­rial de tra­ba­lho tam­bém com­põe seu vi­sual com as peças que con­se­gue vas­cu­lhan­do por aí.

Apesar desta pro­pos­ta de vin­ta­ge ser a prin­ci­pal ca­rac­te­rís­ti­cas deste se­gui­men­to, por aqui nem sem­pre é esta a “fi­lo­so­fia” em­pre­ga­da. Em mui­tos lu­ga­res, o único cri­té­rio para a se­le­ção das peças é o fato de es­ta­rem em bom es­ta­do de con­ser­va­ção. Também é muito comum en­con­trar rou­pas de grife, que por serem de se­gun­da-mão, são ven­di­das por um preço bem mais em conta. É o caso do Cama­rim Brechó, que dis­po­ni­bi­li­za aos seus clien­tes um vasto acer­vo. “As rou­pas che­gam e pas­sam por uma ava­lia­ção ri­go­ro­sa para ver se não estão ras­ga­das, des­cos­tu­ra­das. Aqui você en­con­tra de tudo, desde peças mais an­ti­gas até ou­tras super ­atuais”, disse Lara Vilarim, que ad­mi­nis­tra o local há cinco anos ao lado da mãe, Elisabeth Teixeira. Os mais aten­tos vão en­con­trar mar­cas como Carmin, Diesel, Lelis Blanc e Calvin Klain à dis­po­si­ção por pre­ços bem abai­xo do mer­ca­do. É só pro­cu­rar.


Homens à moda an­ti­ga







Apesar de mais raras, a maio­ria dos bre­chós tam­bém ofe­re­cem peças mas­cu­li­nas. E cada vez mais, “eles” estão ade­rin­do à moda dos vovôs. Boinas e cal­ças es­ti­lo­sas cos­tu­mam ser os ar­ti­gos mais pro­cu­ra­dos. “Os ho­mens que vêm aqui têm uma visão mais aber­ta em ter­mos de moda”, afir­ma Cláudia Holanda, dona do Brechó Tutti-Frutti. Já no caso do Camarim Brechó, mui­tos ra­pa­zes vêm acom­pa­nhan­do as es­po­sas e aca­bam se sur­preen­den­do com as op­ções mas­cu­li­nas. “A fre­qüên­cia deles au­men­tou bas­tan­te”, afir­mou Lara Vilarim.


Pesquisa online


Para aque­les que não têm dis­po­si­ção de sair ba­ten­do perna atrás de um look di­fe­ren­te e em conta, a opção são os bre­chós vir­tuais. Há ape­nas seis meses as ami­gas Anna Terra, Catarina Souto, Juliana Benssat e Carolina Burgo des­co­bri­ram na internet uma pos­si­bi­li­da­de de dar fim as rou­pas en­cos­ta­das no ar­má­rio e ainda fa­tu­ra­rem uma gra­ni­nha. Desde se­tem­bro, as pu­bli­ci­tá­rias vi­ra­ram só­cias e co­lo­ca­ram no ar o blog: www.com­que­la­you­teu­vou.blogs­pot.com

O for­ma­to, po­pu­lar en­tre os in­ter­nau­tas, tem fei­to su­ces­so. “A ca­rac­te­rís­ti­ca do online é ser di­nâ­mi­co e não ter regra. As pe­ças da vovó são mais ca­rac­te­rís­ti­cas dos que as dos bre­chós con­ven­cio­nais. Na rede usa­mos de tudo” disse Catarina.

Todo o pro­ces­so de es­co­lha e venda é feito vir­tual­men­te, atra­vés do blog e por e-mail. “É pre­ci­so haver uma re­la­ção de con­fian­ça entre a gente e o clien­te, mas até agora tem dado certo”, afir­mou.

Serviço
Brechó Tutti-Frutti
R. José de Alencar, 636, Ilha do Leite
Fone: 81 3222 3895

Camarim Brechó
Alberto Paiva, 248, Graças
Fone: 81 3241 0248

www.comquelayouteuvou.blogspot.com
e-mail: com­que­la­you­teu­vou@gmail.com

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 05/04/2009