segunda-feira, 19 de abril de 2010

O Olimpo das vaidades


Kataklò é uma palavra de origem grega. Ela define o espírito do trabalho. O nome não poderia ser melhor para uma companhia de dança, que transformou ex-atletas em bailarinos, fazendo uso do vigor físico e de suas possibilidades corporais. Na sexta-feira, no Teatro da UFPE, o público que acompanhou “Play”, destes artistas italianos, não teve dúvidas de que a técnica deles tinha de ser exaustiva, para alcançar a precisão dos movimentos.

Entretanto, para um espetáculo que vislumbra reunir esportes, dança e teatro em uma única apresentação, músculos e acrobacias perfeitas não são suficiente. Em cerca de 17 pequenas coreografias, em dois atos, a companhia tenta aproximar o público de diversas modalidades olímpicas oferecendo outras perspectivas.

Mas na maioria das composições falta maturidade coreográfica, o que torna o espetáculo até previsível. Poucos momentos são surpreendentes, como o do ringue de boxe, no qual os bailarinos camuflados fazem dançar, na verdade, as cordas do ringue, e não os boxeadores. Ou mesmo no movimento em que os bailarinos parecem se transformar em deuses do Olimpo.

“Play” é bonito de ser visto. Humorado, brinca ironicamente com esportes, como no futebol, e outros bem distantes, como o trenó olímpico. Mas ainda assim, fica a sensação de que nenhuma história foi contada, ou sentida. Sob músculos e acrobacias, sente-se falta de profundidade e sensibilidade.


* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 19/04/2010

A “Rainha” tem identidade negra

Companhia brasiliense aproxima dança e literatura para fazer crítica social


Não é de hoje que a bailarina e coreógrafa Laura Virgínia desenvolve trabalhos que reúnem a dança e a literatura. Graduada em Letras pela Universidade Federal de Brasília, Laura começou a seu trabalho de pesquisa, intitulado “Escridançando”, em 1997, quando já dançava profissionalmente. Em 2004, ela fundou a companhia de dança Margaridas - onde atua como diretora, bailarina e coreógrafa -, e com ela chega ao Recife para apresentar o espetáculo “Rainha”, hoje e amanhã, às 19h, no Sesc de Casa Amarela.

De acordo com Laura, “Rainha” nasceu de sua vontade pessoal de explorar com mais profundidade a condição da mulher negra na atualidade. “Eu fiz uma matéria sobre escritoras negras na literatura. A partir daí, cheguei ao livro ‘O olho mais azul’ da estadunidense Toni Morrison (Prêmio Nobel de Literatura), que conta a história de uma menina negra que queria ter o olho igual o da atriz Shirley Temple. A experiência despertou em mim a vontade de me aprofundar na identidade negra”, explicou Laura.

A ideia foi proposta ao grupo, e junto com Cleani Marques, com quem divide o palco, e Édi Oliveira, responsável pela criação coreográfica, o espetáculo começou a ser concebido. E, juntos, optaram por abordar questões relacionadas a gênero, preconceito, classe-social, autoestima, orgulho e ironia. Os poemas foram usados tanto como inspiração para expressar o imaginário feminino negro, como também para compor a própria dança. “Quando trouxemos a pesquisa para o universo editorial do Brasil foi bem diferente. Aqui trabalhamos com autoras com títulos com baixo potencial editorial, enquanto nos EUA há um prêmio como o Nobel”, destaca a bailarina.

Entre os textos selecionados para compor o espetáculo e inspirar suas cenas encontramos material das escritoras brasileiras: Carolina Maria de Jesus e Conceição Evaristo (Minas Gerais); Cristiane Sobral e Tatiana (Brasília); Elisa Lucinda (Espírito Santo); e Andréia Lisboa e Negra Li (São Paulo). Os poemas das artistas norte-americanas são de Toni Morrison (Ohio); Alice Walker (Geórgia); Audre Lord (New York) e Maya Angelou (Missouri).

Apesar de se tratar de um espetáculo de dança, “Rainha” segue a premissa da companhia que na tentativa de agregar literatura e dança, trabalha sempre à fala junto com o movimento. “É de fato um trabalho mais difícil, porque além do treinamento corporal, temos aulas com uma fonoaudióloga e com uma professora de canto. Temos sempre um trabalho extra”, diz Laura, fazendo menção a o tipo de estética adotado pela companhia. E completou: “Também é preciso bastante cuidado porque o espetáculo não pode ter uma direção tradicional de teatro. Não temos personagens. Temos narradores que dançam”.

Com figurino e cenografia que valorizam objetos do cotidiano. O objetivo do espetáculo é colocar a mulher numa hierarquia que alcance o patamar mais alto, nesse caso, “Rainha”. A trilha sonora reforça esse universo feminino negro utilizando as canções “Four women” e “Images” de Nina Simone; “Tarata” de Clementina de Jesus; e “Ilu ayê” na voz de Clara Nunes.

As apresentações fazem parte do projeto de circulação do espetáculo, contemplado pelo prêmio Klauss Vianna, da Funarte. E, além de Recife, o grupo vai passar por Brasília, Campo Grande, Palmas, João Pessoa e Goiânia.

Serviço

“Rainha”

SESC Casa Amarela

Sábado (17) e domingo (18), às 19h

Ingressos: R$ 10 (inteira) R$ 5 (meia-entrada)


* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 17/04/201

Dança para refletir sobre o tempo

“5 Minutos Para Blackout” questiona existência humana, o tempo e a vida

Quando fez sua estreia durante o Festival Janeiro de Grandes Espetáculos deste ano, “5 Minutos Para Blackout”, espetáculo da Acupe Grupo de Dança, além de ter repercutido bastante no cenário local, também angariou seis indicações a prêmios em várias categorias do Festival, entre elas para melhor espetáculo de dança, e de melhor trilha sonora, para a composição do músico pernambucano Fred 04, que debutou na função compondo para a montagem. Agora, aqueles que não tiveram a chance de assistir a única apresentação do grupo feita durante o evento, terão a oportunidade de acompanhar o espetáculo, que volta aos palcos do Recife, hoje.

Ao todo serão quatro apresentações. Duas no teatro Barreto Júnior, hoje, às 19h30, e amanhã, às 20h, sendo a primeira apresentação fechada, e gratuita, para estudantes de escolas públicas através de uma parceria com o projeto Educação para o Teatro. As outras duas acontecem no teatro de Santa Isabel, nos dias 28 e 29 de abril.

Partindo das reflexões acerca do tempo feitas pelo coreógrafo e pesquisador austríaco, Rudolf Laban, “5 Minutos Para Blackout” propõe questionamentos sobre a existência humana, o tempo, e a trajetória da vida. “Tinha um interesse pessoal em desenvolver um estudo do movimento proposto por Laban. E a linguagem dele é universal, todo mundo entende, ou no mínimo desperta o interesse para o entendimento”, explicou Paulo Henrique Ferreira, que assina o texto e a direção do espetáculo.

A montagem, que é dividida em quadrantes que representam o tempo, o espaço, o fluxo e o peso - E descrevem a existência humana na trajetória da vida até a morte, na perspectiva de um dia (24h) - marcou ainda o retorno de Maria Eduarda Buarque ao posto de coreógrafa.

“A Maria também fez alguns cursos no Laban/Bartenieff, em Nova Iorque. Passamos dois meses no processo de pesquisa e discussão da proposta. Somente depois começou o processo com os bailarinos. Costumo dizer que eles são coautores, porque a proposta foi feita por nós, mas eles iam imprimindo suas particularidades, e ela ia ajustando tudo isso”, completa fazendo menção aos nomes de Fernanda Lobo, José W. Júnior (em revezamento com Kizer Carvalho), Mieja Chang, Paulo Henrique Ferreira e Roberta Cunha, bailarinos que fazem parte do elenco.

Paralelamente às apresentações, Paulo Henrique também vai ministrar oficinas de dança que fazem parte do projeto. A primeira no Cepoma de Brasília Teimosa, de 19 a 23 de abril, e a segunda no Sesc Santo Amaro, de 26 a 30 de abril. As oficinas são gratuitas.

Serviço

“5 Minutos Para Blackout”

Teatro Barreto Júnior - 15 de abril, às 20h

Teatro de Santa Isabel - 28 e 29 de abril, às 20h

Ingressos: R$15 (inteira) e R$7,5 (meia entrada)

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 14/04/2010

Zéu Britto numa conversa de botequim com Boccaccio

Talento do ator, e compositor, dá a Decameron o tom certo da comédia moderna

“Só quero raspadinha meu bem, se você quiser eu raspo também”. Os irreverentes versos de uma das composições de Zéu Britto davam as boas vindas ao público que chegava para assistir ao espetáculo Decameron, no último sábado, no teatro da UFPE. Parte do elenco recebia os convidados no hall de entrada do teatro, fazendo uma verdadeira “bagunça musical”, como bem definiu o diretor Otávio Müller, em entrevista a Folha de Pernambuco.

No violão, o próprio Zéu puxava o coro de suas canções nada ortodoxas. O escracho, e a ousadia de Zéu – falando de uma forma mais suave aos leitores – são o encaixe perfeito para a montagem do texto retirado da obra italiano, Giovanni Boccaccio.

Um (Boccacio), personagem emblemático na literatura do século 14, que com seus escritos foi considerado um marco entre a moral medieval e o realismo. O outro (Zéu), considerado por muitos verborrágico e amoral. E ambos revolucionários. Cada um a seu tempo. Por certo se não tivessem vivido com mais de sete séculos de separação. Tomariam uma cerveja no botequim, e o assunto não seria outro que não: sexo.

São justamente as composições de Zéu, - presentes ao longo de todo o espetáculo - que fazem com que Decameron não se torne uma comédia datada. Ainda que a temática da peça – que trata do cotidiano de comerciantes de uma vila e de suas mulheres fogosas , dispostas a tudo para conseguirem “furnicar” – a primeira vista pareça um tema atual. São os cacos, e as tiradas, dos atores que dão o tom mais moderno à comédia.

Além de Zéu, a atuação impagável de Marcos Oliveira (o Beiçola de "A grande família") e George Sauma (o Tatalo de “Toma Lá Dá Cá”) arrancaram gargalhadas não só do público, como também do próprio elenco. A leveza, e a forma como os atores se divertem em cena, de fato fazem a diferença. Acabam envolvendo o público que – em alguns momentos literalmente – passa a fazer parte do espetáculo e sendo mais um habitante da Serra da Xavasca.


Montagem de “O Auto da Compadecida” faz 18 anos

Clima de festa permeou a apresentação no Teatro do Parque

Clima de festa, fila na porta, banda e artistas de circo dando boas-vindas aos convidados. O clima dava indícios que se tratava da comemoração de uma data bastante importante. Na noite de ontem, o público lotou o teatro do Parque para prestigiar o aniversário de 18 anos da montagem “O Auto da Compadecida”, da Dramart produções. A peça é inspirada na obra homônima de Ariano Suassuna.

Foi uma noite de emoção para quem estava nos dois lados do palco. Na plateia, nomes ilustres que já fizeram parte da produção, como o maestro Forró - que fazia parte da banda do espetáculo, quando ainda não tinha sequer recebido o título de maestro - davam o tom comemorativo da festa. Era momento de celebrar uma marca dificilmente atingida no teatro, principalmente em se tratando de produções locais.

Em cena, os atores mostraram o porquê de estarem há tanto tempo em cartaz. O elenco se diverte no palco, é quase como se cada montagem já tivesse se apropriado de seu personagem. O tom popularesco de circo mambembe, no qual um palhaço é o narrador da história, aproxima o público do universo apresentado brilhantemente no texto de Ariano.

Mesmo não contando com apresentações regulares, a sintonia entre Sóstenes Vidal (João Grilo) e Williams Sant’Anna (Chicó) é evidente. Sóstenes, inclusive, tem passado boa parte de seu tempo no Rio do Janeiro, em função das gravações da próxima novela global (Passione) da qual fará parte. Mesmo diante da ausência de ensaios, e da agenda esparsa de apresentações, a relação entre os atores em cena é bastante interessante.

Ao final do espetáculo, Williams assumiu o lugar de Socorro Raposo (fundadora da Dramart) e fez as honras da casa falando da felicidade do elenco em atingir a maioridade com a peça. O ator falou da experiência adquirida nas apresentações feitas por todo País e prestou uma homenagem ao ator e encenador Marco Camarotti - falecido em 2004 -, que durante anos dirigiu o espetáculo. Para encerrar a comemoração em grande estilo, João Grilo com toda sua irreverência regeu a banda num grandioso “Parabéns pra Você”.

* A matéria foi publicada no caderno "Geral" da Folha de Pernambuco de 15/03/2010

A maioridade de um clássico

Adaptação de “O Auto da Compadecida”, da Dramart Produções, completa 18 anos em cartaz

Difícil encontrar um espetáculo que tenha permanecido tantos anos na estrada sem grandes alterações. Ainda mais, em se tratando de um grupo tão extenso. A montagem Dramart Produções reúne, ao todo, 15 atores, cinco músicos e quatro técnicos, que juntos, completam amanhã 18 anos de apresentações ininterruptas, se gabando de terem sofrido apenas algumas poucas substituições. A data especial será celebrada em uma única apresentação, às 19h30, no Teatro do Parque. Com ingresso promocional de aniversário no valor de R$10 para todos.

Para saber um pouco mais sobre a história por traz da história, a Folha de Pernambuco conversou com atores que acompanharam toda esta jornada: Socorro Rapôso, Compadecida e fundadora da Dramart; Luiz César, padre João e co-fundador da Dramart; Célio Pontes, Severino do Aracaju e ex-assistente de direção do espetáculo; Williams Sant’Anna, Chicó e atual assistente de direção; e Leidson Ferraz, que vive os papéis do frade e do demônio, relembraram fatos e curiosidades divertidas, e outras que guardam com carinho, dessa montagem que caiu nas graças do público e já faz parte da história do teatro pernambucano.

Começando do começo, em 1991, a produtora Socorro Rapôso iniciou o planejamento de um espetáculo para celebrar os 10 anos da Dramart Produções, comemorados no ano seguinte. De Ariano Suassuna, dramaturgo admirado e amigo de Socorro, a farsa “O Auto da Compadecida” foi a eleita. A escolha do texto também tinha origem na relação pessoal de Socorro com a peça. “O Auto...” foi o primeiro espetáculo da vida da produtora, tendo feito a Compadecida com o grupo Teatro Adolescente do Recife em 1956. Na direção, mais um amigo, o professor Marco Camarotti, PhD em Teatro Popular.

A estreia da nova montagem aconteceu no dia 14 de marco de 1992, no teatro Valdemar de Oliveira. De lá pra cá foram muitas temporadas e muita história. A própria Socorro teve a chance de ir à Sapucaí com seu personagem. “Em 2002 a Império Serrano fez o desfile em homenagem a Ariano. Na época a minissérie da TV estava no auge, e todo elenco foi convidado. Mas em uma entrevista para o Jornal do Brasil, Ariano disse que gostaria que, com relação à Compadecida, convidassem ‘a de ontem, de hoje e de sempre’. Se referindo a mim”, conta Socorro, recordando o desfile que a emocionou muito.

Como co-fundador da Dramart Produções, o ator e produtor Luiz César chegou ao elenco meio que por acaso. Quando cursava Relações Públicas na mesma faculdade de Socorro, Luiz foi confundido com um padre que estudava na mesma sala. Do episódio, veio um namoro e um convite para integrar o elenco. “Acho que ela me achou com cara de padre. Desde então, esse acabou sendo um papel recorrente na minha vida”, brinca Luiz César.

As histórias são muitas. Célio Pontes tem lembranças de quase toda uma vida. Entrou para Dramart quando ainda tinha 14 anos, no espetáculo “O Mágico de Oz”. Pouco tempo depois, foi convidado por Socorro para fazer parte do elenco do Auto. Mas, foi um convite de Camarotti que foi decisivo na carreira de Célio. “Marco Camarotti me chamou para ser assistente de direção do espetáculo. Isso me deu a oportunidade de aprender muito sobre todos os aspectos do teatro”, destaca o ator.

Outro que atribui ao “Auto...” a emoção é Williams Sant’Anna. Além de ter com Sóstenes Vidal, seu companheiro de cena que vive João Grilo, uma enorme cumplicidade, o ator tem uma relação bastante próxima com os demais companheiros de palco. “Fazer o Palco Giratório do Sesc era um grande sonho. Em 1998, quando finalmente havíamos conseguido e estava tudo pronto para começarmos a turnê pelo Interior do Estado, eu fiquei muito doente. Tínhamos a opção de desistir de um sonho e frustrar o grupo inteiro, ou tentar fazer, mesmo assim. E nós fizemos”, lembra ele.

Leidson Ferraz, o caçula da turma, também foi um dos últimos a entrar no elenco - três anos depois do debut da montagem. “Estreei com o teatro Santa Isabel lotado. Como meu personagem tem uma relação com a plateia, foi uma coisa muito especial”, recorda Leidson.

Além da apresentação deste domingo, o grupo aguarda a finalização do edital Funcultura 2009, no qual concorrem com um projeto de oito apresentações populares do “Auto...”, com distribuição gratuita de 200 convites.Outro projeto que a Dramart tem na gaveta, à espera de patrocínio, é apresentação do espetáculo usando igrejas como cenário para montagem.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 13/03/2010

Um entrelugar no limite do corpo

“4 x 4” reforçou a maestria de Deborah Colker em combinar força com precisão

Quem nunca assistiu, e vai pela primeira vez, a um espetáculo da Cia, de Dança Deborah Colker, compreende o porquê da coreógrafa ser a primeira brasileira a dirigir uma apresentação dos canadenses do Cique du Soleil. Força e vigor físico são características marcantes do espetáculo “4 por 4”, apresentado no último sábado, para um teatro Guararapes quase lotado. Entretanto, mais do que o domínio de corpo, do qual compartilham as duas companhias, em “4 por 4” o que chama mesmo a atenção é a leveza e precisão dos movimentos, bem como a plasticidade do espetáculo.

Dividido em dois atos, a primeira parte traz para o público três movimentos que propõe ao público um encontro da dança com as artes plásticas. Com 17 pessoas em cena, temos os quadros “Cantos” (baseado em Cildo Meireles), “Mesa” (Chelpa Ferro), “Povinho” (Victor Arruda) que são artistas de tempos e formas diferentes virando dança.

Em “Cantos”, os bailarinos interagem com seis estruturas montadas a partir da obra do artista. A dureza dessas estruturas só é quebrada por uma fresta que existe em uma delas, e permite que os corpos se entrelacem. Em “Mesa” - talvez o mais minimalista dos movimentos - os bailarinos dançam sobre um mesa, com uma tela de fundo verde. É plasticamente interessante, mas coreograficamente repetitivo. “Povinho” é colorido, divertido, despretensioso e simples. Bom ver esse tipo de coreografia brincando com a seriedade da experimentação, a qual se impõe o gênero contemporâneo.

Porém, é só no retorno do intervalo que o espetáculo se torna grandioso. “Vasos”é um verdadeiro desafio aos limites do possível. Coreografia angustiante que prende o fôlego do público, enquanto os bailarinos deslizam sobre 90 vasos dispostos no chão. Num dos momentos mais belos do espetáculo, depois que os vasos são içados, Dielson Pessoa - único pernambucano na Cia. - encerra a apresentação com um solo impecável.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 22/03/2010

Leveza e precisão “4 por 4”

Cia. Deborah Colker chega ao recife com espetáculo repaginado

No cenário da dança contemporânea nacional, nenhuma pessoa tem um nome tão expressivo quanto Deborah Colker. Primeira mulher no mundo a dirigir um espetáculo do Cirque du Soleil, “O Ovo”, ela vive um momento profissionalmente pleno. Reconhecida não apenas por seu talento evidente como bailarina e coreógrafa, ela se destaca por sua inquietude constante e sua busca de novos espaços na dança. E, claro, a coreógrafa continua a tocar sua Cia. de Dança com a qual retomou a turnê do espetáculo “4 por 4”, concebido originalmente em 2002, e que volta ao Recife para apresentações amanhã e domingo, no teatro Guararapes.

“O espetáculo está afinadinho”, disse Deborah, em entrevista a Folha de Pernambuco, por telefone. A afinação, ao que parece, tem muito a ver com a maturidade dos bailarinos, e com algumas mudanças técnicas ( e cênicas), que aconteceram em função das apresentações no Lincoln Center, em Nova Iorque, em outubro do ano passado. “A tela de fundo é nova, e agora permite que os bailarinos entrem ainda mais na pintura. Também há mudanças de figurino, e na própria experiência dos 17 bailarinos em cena, que já não são os mesmos que eram há oito anos atrás”, explica.

“4 por 4” propõe um encontro entre as artes plásticas e a dança. No palco, os bailarinos interagem com trabalhos de Cildo Meireles, Chelpa Ferro, Victor Arruda e Gringo Cardia. Em alguns momentos, dançam por entre 90 vasos de cerâmica, num exercício de leveza e precisão, que põe em cheque os próprios limites. Além disso, cinco quadros compõe a cenografia.

Para tristeza dos fãs de Deborah - que participa do espetáculo tocando Mozart no piano (uma de suas múltiplas facetas) - ela adianta que não será possível estar no Recife junto com a companhia. “Em função do compromisso com o Cirque precisarei estar em Nova Iorque neste final de semana”, diz. A ausência, entretanto, por certo não deve tirar o brilho do espetáculo, que é considerado um dos mais plásticos da companhia.

Serviço

Cia de Dança Deborah Colker - Espetáculo 4 por 4

Teatro Guararapes - Centro de Convenções

Amanhã, às 20h, e Domingo às 21h

Ingressos:

Platéia R$ 70 inteira e R$35 estudante

Balcão R$ 50 inteira e R$ 25 estudante

Informações: 3182.8020

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 19/03/2010

Famílias marcam estreia da Paixão de Cristo do Recife

Apresentações gratuitas seguem até o Domingo de Páscoa

A noite de lua e o bom tempo foram propícios para dar início à 14ª temporada de apresentações da Paixão de Cristo do Recife. Na noite de ontem, José Pimentel e um elenco formado por cerca de 50 atores pernambucanos e mais 300 figurantes encenaram mais uma vez a história de amor e sofrimento de Jesus Cristo. Na Praça do Marco Zero, o que se pôde ver foram muitas famílias que levaram crianças de todas as idades para acompanhar o espetáculo. As apresentações, gratuitas, seguem até o Domingo de Páscoa, sempre às 20h.

A auxiliar de serviços gerais Célia da Silva assistiu ao espetáculo ao lado do marido e dos dois filhos, de 7 e 4 anos. “Já tinha trazido eles para assistir ao ‘Baile do Menino Deus’ e eles adoraram. Foram eles mesmos que pediram para vir novamente”, disse Célia, que é católica e acha o momento de celebração importante para fazer as crianças terem mais contato com a história de Jesus.

Um menino de 11 anos, que terá seu nome preservado, também estava acompanhando tudo atentamente - apesar de, entre uma cena e outra, aproveitar para vender alguns sacos de pipoca. “É bom porque dá para assistir e vender bem. O movimento sempre aumenta”, afirmou o garoto.

Para Antônio Araújo, a experiência se repete há algum tempo. Trabalhando como gari há 16 anos, Araújo disse que todos os anos faz questão de parar um pouquinho o trabalho para acompanhar as cenas que mais gosta. “A parte que mais me emociona é a morte de Cristo”, destacou. E esse é, de fato, o principal mérito da Paixão de Cristo do Recife: aproximar do teatro pessoas com poucas oportunidades de ter esse contato, através de uma história que tem um forte apelo popular.

PRODUÇÃO

Já no contexto cênico, a apresentação de ontem passou por dificuldades. Em algumas passagens, a direção de elenco pecou tanto na colocação dos atores, quanto dos figurantes. A exemplo do bacanal de Herodis, que, além de ter sido excessivamente logo, virou um grande amontoado de pessoas.

José Pimentel, que comemora, em 2010, 33 anos no papel de Jesus, também enfrentou alguns problemas técnicos na passagem da crucificação e no momento apoteótico da ressurreição. Neste último, aparentemente, o cabo que faz a suspensão do ator demorou a funcionar, quebrando um pouco o ritmo do espetáculo.

* A matéria foi publicada no caderno "Geral" da Folha de Pernambuco de 01/04/2010

Uma Paixão para o Recife

Em sua 14ª temporada, espetáculo marca os 33 anos de José Pimentel no papel de Cristo

Hoje, pela 14ª vez, o Marco Zero, no Recife Antigo, recebe a montagem da “Paixão de Cristo do Recife”. E a história, contada em três palcos, que se transformam em nove diferentes cenários, tem uma conotação diferente para o elenco, em especial para José Pimentel, que este ano comemora 33 anos interpretando Jesus. O espetáculo está diferente - diferenças facilmente percebidas para quem acompanha sua trajetória desde o início.

Pimentel, que além de atuar, assina a direção do espetáculo, diz que haverão novos efeitos de luz na passagem da ressurreição. “Mesmo a cena da ascensão - que já vem sendo bastante elogiada -, passou por reformulações para surpreender o público”, diz. E destaca como outro ponto forte do espetáculo, o envolvimento dos atores com os personagens, já que a maioria faz parte do elenco desde o início. A montagem, que surgiu como uma “alternativa” à “Paixão de Cristo de Nova Jerusalém”, deixou de lado o ar de improvisação.

Falando sobre as questões práticas, adereços e figurinos foram reformados e os efeitos cênicos estão mais significativos. Lilian Pimentel - filha de José Pimentel -, e Roberto Vasconcelos são os responsáveis pelas mudanças. Octávio Catanho, mais conhecido como Tibi, é o responsável pela cenografia dos palcos, que a cada ano precisam ser reforçados em função do forte vento no local.

Tempos melhores e recentes. No ano passado, em função de cortes nos recursos, o espetáculo fez apenas três apresentações, ao contrário das cinco habituais (este ano, as apresentações seguem até o próximo domingo, quando é comemorada a Páscoa). Mas de acordo com o diretor da Associação de Produtores de Artes Cênicas de Pernambuco (Apacepe), Paulo de Castro, que faz a produção do espetáculo, nessa temporada os recursos alcançados através de patrocínios e parcerias atingiram R$ 336 mil, quando o projeto geral estava orçado em R$ 450 mil. “Ainda assim conseguimos fechar as cinco apresentações”, disse o produtor. Gratuita, a encenação chama atenção do público, que responde ao empenho da produção em manter a agenda. “Mesmo com tantas opções as pessoas vão ao Marco Zero assistir a magia que transforma aquele local. Além da emoção da história, também é fundamental a localização, e o fato do espetáculo ser aberto a todos. A “Paixão do Recife” é importante porque é um espetáculo para família,de paz”, garante Paulo de Castro.

* A matéria foi publicada no caderno "Programa" da Folha de Pernambuco de 31/03/2010

Paixão de Cristo está pronta para o público

Expectativa é receber sete mil espectadores diariamente


Tudo pronto para dar início a 43ª temporada do maior espetáculo ao ar livre do mundo. De hoje até o próximo dia 3 de abril, a cidade cenográfica de Nova Jerusalém, localizada no Brejo da Madre de Deus, Agreste pernambucano, receberá um público diário de aproximadamente sete mil pessoas para acompanhar a saga da Paixão de Cristo.

Na noite de ontem, em sessão especial para convidados e Imprensa, o elenco global formado por Eriberto Leão, Suzana Viera, Paulo César Grande e Mauro Mendonça mostrou que está afiado com história, fazendo uma apresentação praticamente impecável. A única exceção foi uma pequena falha no áudio durante a cena do Tribunal de Pilatos, mas que foi rapidamente solucionada.

Depois de tantas temporadas a “Paixão” está cada vez mais grandiosa. A cenografia é impecável, bem como os figurinos, que levam a marca incontestável de Xuruca Pacheco. A professora aposentada, Aglaiena Costa, ficou surpresa com a grandiosidade da montagem. “Não assistia ao espetáculo desde os tempos de (José) Pimentel. Estou achando tudo uma maravilha”, disse a Aglaiena, que assistiu a apresentação ao lado da irmã e da filha.

Outra preocupação da produção, pelo segundo ano consecutivo, diz respeito à acessibilidade. Para isso, a apresentação de hoje vai contar com um grupo de apoio que vai acompanhar cadeirantes, e grupos da melhor idade, auxiliando na locomoção entre os cenários. A cadeirante Maria Niedja acompanha o espetáculo há vários anos e aprovou a iniciativa. “A estrutura está cada vez melhor. O apoio nos dá mais segurança para percorrer as distâncias”, afirmou.

Voltando ao desempenho dos atores, Eriberto Leão, tinha como objetivo apresentar um Cristo mais “Guevariano”, entretanto sua atuação não pareceu tão revolucionária. Quem de fato roubou a cena, foi Suzana Viera, que longe de ser uma Maria contida, ganhou mais falas e a tietagem do público.

Durante a coletiva de Imprensa realizada após a apresentação, a atriz destacou que veio fazer uma Maria questionadora e revolucionária. “Quando cheguei no ensaio fiquei revoltada porque vi uma Maria apagada, escorada em João Batista e em Maria Madalena. Eu disse eu não, eu vou me estapiar com aqueles guardas. Eu sou Maria do Carmo, uma Maria pernambucana. É essa a Maria que fiz. Revolucionária e briguenta”, afirmou a atriz, que ainda está com algumas dificuldades em acertar o ritmo da dublagem do espetáculo.

* A matéria foi publicada no caderno "Geral" da Folha de Pernambuco de 26/03/2010